Alameda Casa Editorial
Alameda Casa Editorial é uma editora brasileira especializada na publicação de livros de não ficção, com foco em ciências humanas. Foi fundada em 2004 pelos jornalistas Haroldo Ceravolo Sereza e Joana Monteleone e pelo historiador Rodrigo Ricupero. Seu primeiro lançamento foi o livro A Revolução dos Cravos, do historiador Lincoln Secco.[1] Progressivamente, passou a publicar outros gêneros.
Boa parte do catálogo da editora se concentra em obras nas áreas de história, crítica literária, antropologia e filosofia. O primeiro título lançado, por exemplo, discute como os movimentos guerrilheiros na África ajudaram a forjar as ideias que influenciaram o movimento militar de esquerda responsável pela Revolução de Abril, a queda da ditadura salazarista em Portugal e o fim do império colonial português.[2][3] O trabalho foi originalmente a tese de doutorado de Secco. A publicação foi coeditada pela Cátedra Jaime Cortesão da USP.[4]
Também fazem parte do catálogo da editora livros-reportagem e alguns títulos de ficção, como o romance A Nova Ordem, de Bernardo Kucinski,[5] e o livro de contos e crônicas Eu preferia ter perdido um olho, de Paloma Franca Amorim.[6]
Em 2015, o livro A Casa da Vovó, de autoria de Marcelo Godoy e editado pela Alameda, foi vencedor do Prêmio Jabuti na categoria Reportagem e Documentário.[7] O livro-reportagem conta a história do DOI-Codi de São Paulo, um centro semi-clandestino de detenção e tortura fundado durante a ditadura militar brasileira que influenciou os órgãos de repressão aos movimentos de esquerda em todo o país.[8]
Em 2020, em um contexto de crise do mercado editorial, marcado por graves dificuldades financeiras das duas maiores redes de livrarias físicas do Brasil[9] e exacerbado pela pandemia de covid-19, a editora Alameda lançou um clube de assinaturas chamado “Coleção Garimpo dos Editores”. O clube de assinantes foi apontado pelo portal de notícias PublishNews como uma maneira encontrada pela empresa para lidar com a crise.[10] Também durante a emergência sanitária causada pelo coronavírus, a editora lançou uma coletânea com dez histórias chamada Histórias da pandemia.[11]
Livros políticos
editarA Alameda integra a comissão organizadora do Salão do Livro Político. O evento tem como objetivo aumentar a visibilidade e incentivar as vendas e a leitura de livros de conteúdo político. Realizado em São Paulo, o salão teve cinco edições. A última, em maio de 2019, homenageou o educador Paulo Freire.[12]
Em 2016, após a abertura do processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, a Alameda publicou uma coletânea de textos e depoimentos chamada Historiadores pela Democracia, que procurou apresentar uma espécie de “diagnóstico historiográfico” sobre o momento político pelo qual o Brasil passava. O livro foi lançado por um grupo de pesquisadores que se posicionaram em defesa da manutenção do mandato de Dilma Rousseff, denunciando irregularidades e interesses subjacentes ao processo de impeachment.[13] As organizadoras da obra foram as historiadoras Hebe Mattos, Tânia Bessone e Beatriz G. Mamigonian.[14]
Entre as prioridades editoriais da Alameda estão a história da escravidão e da ditadura militar brasileira. Entre os livros relacionados a este último tema, figura À Espera da Verdade: histórias de Empresários, Jurista e Elite Transnacional História de Civis Que Fizeram a Ditatura Militar, produzido por uma equipe de cinco pesquisadores: Joana Monteleone, Haroldo Ceravolo Sereza, Vitor Sion, Felipe Amorim e Rodolfo Machado.
A editora também publicou o livro Cativeiro sem fim – As histórias dos bebês, crianças e adolescentes sequestrados pela ditadura militar. O livro reuniu 19 casos de crianças e adolescentes separados dos pais, alguns entregues a famílias militares, após o golpe militar de 1964. A maioria dos casos (11) são de filhos de guerrilheiros da região do Araguaia e de habitantes da região que foram igualmente reprimidos pelos militares, mesmo sem envolvimento direto com a Guerrilha do Araguaia.[15]
Bibliodiversidade
editarOs donos da editora Alameda têm uma marcada atuação política na defesa da regulação do setor livreiro no Brasil. Em uma entrevista concedida em 2013, Haroldo Ceravolo Sereza defendeu o reconhecimento do setor como uma economia, ainda que de menor escala, e a adoção de políticas públicas específicas. Em sua avaliação, apesar das isenções de impostos concedidas pelo governo brasileiro à cadeia do livro, o setor é prejudicado pela desorganização e oligopolização da cadeia produtiva. Entre as medidas defendidas para combater esse quadro estão a disponibilização de crédito compatível com o capital de giro das empresas e uma regra para limitar o desconto concedido pelas livrarias por meio da uma lei do preço único, semelhante à política do Prix unique du livre francesa, uma vez que os grandes descontos para best sellers teriam de ser compensados por um aumento dos preços praticados pelas editoras em todo o catálogo.[16]
No mesmo sentido, a editora Alameda é membro da Liga Brasileira de Editoras (LIBRE), uma associação sem fins lucrativos que reúne editoras independentes. A associação atua como uma rede que trabalha de forma cooperativa para fortalecer os negócios de seus associados e promover a bibliodiversidade – um conceito de diversidade cultural aplicado ao mundo dos livros. A ideia de bibliodiversidade surgiu no Chile, colocando em questão a visibilidade de diferentes projetos editoriais, para além daqueles vinculados aos discursos hegemônicos e “projetos dominantes”.[17]
Sereza foi presidente da LIBRE por duas gestões consecutivas e é diretor da entidade atualmente. Joana Monteleone foi vice-presidente da entidade de 2015 a 2017. Como diretor, Sereza defendeu a pluralidade editorial como garantia para outras diversidades – racial, linguística, de gênero – e a formulação de políticas públicas para regular o mundo editorial, de forma a favorecer a diversidade em um mercado marcado por um processo acelerado de concentração em poucas grandes editoras e redes de livrarias.[18]
Durante o período, a LIBRE se engajou ativamente na construção do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (PMLLLB) de São Paulo. O plano orienta as políticas públicas da cidade para o tema da leitura e começou a ser discutido em 2012 por iniciativa da sociedade civil e do parlamento municipal, por iniciativa do vereador Antonio Donato. Em 2014, foi constituído um grupo de para a construção do plano junto à Secretaria Municipal de Cultura. O grupo de trabalho reuniu representantes do poder público, do mercado editorial, de bibliotecas públicas e escolares, projetos comunitários de leitura, organizações do terceiro setor e da cena dos saraus, além de mediadores de leitura e escritores marginais. Sereza, da Alameda, e Francisco Ednilson Xavier Gomes, da Cortez Editora, foram os representantes do segmento de editoras e livreiros neste grupo.[19]
Após a aprovação do plano, em 2016 foram realizadas eleições para o Conselho Municipal do PMLLLB. Sereza foi um dos eleitos para integrar o conselho, que tem como competências acompanhar e fiscalizar a execução do PMLLLB, promover discussões e articular demandas regionais e setoriais referentes aos temas de que o plano trata.[20] Com a posse de João Doria na prefeitura, o conselho foi desmontado pelo secretário André Sturm, sendo recriado em 2019 sob a gestão de Bruno Covas. Sereza foi novamente um dos eleitos para representar a sociedade civil.
Em março de 2020, os conselheiros do PMLLLB propuseram uma série de ações emergenciais para tentar proteger o ecossistema do livro durante a quarentena imposta pela pandemia de covid-19. As propostas incluíam a vinculação de toda a cadeia do livro nos decretos de calamidade pública estadual e municipal, desde autores e editoras a bibliotecas comunitárias e livrarias, e a isenção de IPTU para livrarias, editoras e espaços culturais nos anos de 2020 e 2021.[21]
Prêmios
editar- Vencedor do Prêmio Jabuti 2015 – Categoria Reportagem e Documentário: A Casa da Vovó, de Marcelo Godoy
- Vencedor do Prêmio Sergio Buarque de Holanda de ensaio social, concedido pela Fundação Biblioteca Nacional, em 2015: A Casa da Vovó, de Marcelo Godoy[22]
- Finalista do Prêmio Jabuti 2016 – Categoria Gastronomia: Sabores Urbanos: Alimentação, Sociabilidade e Consumo - São Paulo, 1828-1910, de Joana Monteleone[23]
Ligações externas
editarReferências
- ↑ «"A Revolução dos Cravos" inaugura editora». Agência Estado. 5 abr. 2004. Consultado em 10 mar. 2021
- ↑ PublishNews. «Alameda Editorial dá suas primeiras pedaladas». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ «Livros». Pesquisa Fapesp. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Pilagallo, Oscar (30 de março de 2004). «Leituras Cruzadas: Uma no cravo, outra na ditadura». Folha Online. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ PublishNews. «A distopia de Bernardo Kucinski». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Mayor, Mariana (20 de março de 2019). «A poética do jacaré». Esquerda Online. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ «Maria Valéria Rezende e Marcelo Godoy vencem Prêmio Jabuti 2015». G1. 4 de dezembro de 2015. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Godoy, Marcelo (2014). A Casa da Vovó: uma biografia do DOI-Codi (1969-1991), o centro de sequestro, tortura e morte da ditadura militar. 2 ed. São Paulo: Alameda
- ↑ Meireles, Maurício (27 de março de 2020). «Mercado de livros se prepara para pior crise da história com novo coronavírus». Folha de S.Paulo. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ PublishNews. «Apanhadão: como o mercado editorial tem enfrentado a nova crise». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ PublishNews. «Histórias da pandemia». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ PublishNews. «Quinto Salão do Livro Político homenageia Paulo Freire». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Genari, Elton Rigotto; Genari, Elton Rigotto (setembro de 2019). «In the trenches of democratic achievements: history teaching as a target of attacks and site of active resistance». Topoi (Rio de Janeiro) (42): 842–847. ISSN 2237-101X. doi:10.1590/2237/101x02004214. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ PublishNews. «Professoras lançam livro 'Historiadores pela democracia'». PublishNews. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Moraes, Rodrigo Simon de (13 de abril de 2020). «Eduardo Reina - Cativeiro sem fim». Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea (60). ISSN 1518-0158. doi:10.1590/2316-40186013. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Charão, Cristina; Costa, Henrique (25 de fevereiro de 2013). «A economia do livro: tiragens aumentam, mas há gargalos importantes». Desafios do Desenvolvimento. Ipea. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Sereza apud BRITO, Rosaly; ESTEVES, Lorena; VENTURA, Jússia. Mulheres negras não foram feitas para carregar livros: tensionsamento e resposta social em rede na Feira Pan-Amazônica do Livro no Pará. Logeion: Filosofia da Informação, v. 6, n. 1, p. 106-125, 15 set. Disponível em: http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/4848. Acesso em 16 mar. 2021.
- ↑ Dulce, Emily. «Bibliodiversidade: editoras independentes tentam romper cerco do mercado editorial». Brasil de Fato. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ QUEIROZ, Ricardo; ALMEIDA, Marco Antonio; A Participação Social na Construção do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca de São Paulo. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 18., 2017, Marília; UNESP, 2017.
- ↑ «Conselho Municipal do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas – PMLLLB é empossado | Secretaria Municipal de Cultura | Prefeitura da Cidade de São Paulo». www.prefeitura.sp.gov.br. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Rodrigues, Maria Fernanda (27 de março de 2020). «Conselho do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas quer incluir setor nos decretos de calamidade». Babel. Estadão. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ «Editoras independentes se destacam em prêmio da Biblioteca Nacional». O Globo. 4 de novembro de 2015. Consultado em 16 de março de 2021
- ↑ Livraria da Folha (22 de outubro de 2016). «Conheça os finalistas do Prêmio Jabuti». Folha de S. Paulo. Consultado em 16 de março de 2021