Charola do Convento de Cristo
A Charola do Convento de Cristo (c. 1160 – c. 1250) é uma edificação religiosa e museológica localizada na freguesia de São João Baptista, cidade de Tomar, Portugal. A Charola (ou Rotunda) é parte integrante do conjunto histórico genericamente denominado Convento de Cristo (classificado como Monumento Nacional, 1910, e como Património Mundial, 1983 [nota 1]).
Charola do Convento de Cristo | |
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Informações gerais | |
Estilo dominante | Românico, Gótico, Manuelino |
Início da construção | século XII |
Fim da construção | século XIII |
Proprietário inicial | Ordem dos Templários |
Função inicial | Religiosa |
Proprietário atual | Estado Português |
Função atual | Museu |
Visitantes | 100.000 (1º semestre de 2015)[1] |
Religião | catolicismo |
Website | http://www.conventocristo.pt/ |
Património Mundial | |
Critérios | C(i) C(vi) |
Ano | 1983 |
Referência | 265 en fr es |
Património de Portugal | |
Classificação | Monumento Nacional |
Ano | 1910 |
DGPC | 70237 |
SIPA | 4718 |
Geografia | |
País | Portugal |
Cidade | Tomar |
Coordenadas | 39° 36′ 15″ N, 8° 25′ 22″ O |
Localização em mapa dinâmico |
Localizada de início no interior do perímetro muralhado do Castelo de Tomar, a sua construção remonta à origem do castelo (c. 1160) e está intimamente ligada aos primórdios do reino de Portugal e à Ordem dos templários (mais tarde, à Ordem de Cristo), tendo sido interiormente reconfigurada no século XVI. Arquitetonicamente apresenta uma confluência dos estilos românico e gótico, integrando ainda decoração manuelina e um importante conjunto de pinturas e esculturas quinhentistas. Serviu de oratório privativo dos Cavaleiros templários e mais tarde passaria a funcionar como capela-mor da igreja edificada no reinado de D. Manuel I; hoje cumpre funções eminentemente culturais e turísticas.
História e características
editarO Castelo de Tomar foi fundado por Gualdim Pais no reinado de D. Afonso Henriques (1160). A sua construção ligou-se ao processo da reconquista iniciado nesse reinado e ao papel então desempenhado pela Ordem dos Templários. A Charola nasceu no interior do perímetro muralhado do castelo, como oratório privativo dos Cavaleiros e com prováveis funções sepulcrais. Apresenta uma planta centralizada em rotunda, típica das ordens religiosas-militares, em particular da Ordem do Templo, quer como invocação do Santo Sepulcro, de Jerusalém (que terá sido o primeiro exemplo de basílica-martyrium construído na Terra Santa), quer associando-se à imagem da Cúpula do Rochedo (a mesquita de Kubbat-al-Sakhara, 688-691) que era então identificada com o Templo de Salomão, sobre cujas ruínas assentava.[2][3]
A Charola do Convento de Cristo é um dos raros e emblemáticos templos em rotunda da Europa medieval. Segundo o historiador Paulo Pereira, a sua configuração original não é conhecida com precisão; as fontes escritas e desenhadas que testemunham o seu passado não são concludentes a esse respeito, embora se saiba que sofreu modificações (nomeadamente a nível da cobertura). Há entretanto indícios claros de que a sua construção se realizou em duas etapas, separadas por um hiato de cerca de quarenta anos. A primeira decorreu na segunda metade do século XII (c. 1160-1190), num tempo dominado pelo estilo românico, e foi interrompida devido a graves escaramuças com os almóadas; a segunda, correspondente à finalização do templo, terá decorrido entre 1230 e 1250, coincidindo com a afirmação da linguagem gótica em Portugal. Desse extenso período resulta uma obra que cruza elementos de ambos os estilos.[2][4]
A planta da Charola desenvolve-se em torno de um espaço central, octogonal, circundado por um deambulatório cujo paramento exterior se desdobra em dezasseis faces. O interior do tambor central é coberto por uma cúpula assente em ogivas cruzadas de grande verticalidade, e o deambulatório por abóbada de canhão suportada por arcos torais de volta perfeita. Encimado por merlões chanfrados, o exterior da Charola é marcado pela torre sineira e, a sul, por pesados contrafortes, idênticos aos que na origem envolviam toda a construção, estabelecendo-se um claro contraste entre a arquitetura fortemente militarizada do exterior – sóbrio e destituído de qualquer ornamento –, e o elegante interior.[2][4][3]
No século XV, no período de administração do Infante D. Henrique, a edificação sofreu algumas adaptações. Responsável por uma importante fase de reconversão e expansão do convento, o Infante ordenou a abertura de dois tramos, a poente, de modo a instalar um pequeno corpo saliente que terá servido de coro e de tribuna. Mais tarde, já no reinado de D. Manuel I, essas alterações ampliaram-se e tomaram um caráter definitivo. O acesso à Charola, que de início se localizava a nascente, passou a realizar-se a poente, através da abertura de um arco triunfal, concebido e construído por João de Castilho em 1515, de comunicação com a igreja/coro manuelina então construída, gerando uma alteração significativa que transformou a Charola na capela-mor do novo templo. A valorização litúrgica foi então efetivada através de uma intervenção abrangente e multifacetada que incluiu programas de talha e de pintura parietal e integração de importantes peças de escultura e pintura, onde se destacam nomes como os de Jorge Afonso, Olivier de Gand, Fernão Muñoz, Fernão de Anes, Gregório Lopes, Simão de Abreu e Domingos Serrão.[5][6]
A Charola foi, assim, mobilada e enriquecida segundo um programa decorativo que incluiu a adição de decoração em estuque, a aplicação de policromia a diversos elementos ornamentais, o douramento das nervuras, a execução parietal de pintura a têmpera, etc.. De entre as inúmeras intervenções e obras autónomas que então passaram a integrar a Charola, Fernão Anes foi responsável por pinturas murais no tambor central com representações dos instrumentos da Paixão de Cristo; a cúpula da charola (que poderá ter sido então reconstruída, na sequência da queda de um raio que, em 1509, destruiu a lanterna e o coruchéu da charola), recebeu decoração em estuque; a abóbada de canhão do deambulatório foi preenchida por pintura a fresco em trompe l’oeil com motivos arquitetónicos (nervuras, molduras, mísulas, capiteis…), cordas entrelaçadas, troncos, animais; a oficina do pintor régio Jorge Afonso produziu um conjunto de tábuas de grande dimensão (4 x 2,5 m) com episódios da Vida e Paixão de Cristo, que foram integrados na face exterior do deambulatório; Olivier de Gand, assistido por Fernão de Muñoz, criou imagens esculpidas em madeira que foram instaladas sobre mísulas. O programa decorativo haveria de prosseguir ao longo do século XVI com a integração de obras de Gregório Lopes ou com as intervenções dos pintores maneiristas Simão de Abreu e Domingos Serrão.[7][5][6]
Particularmente significativa foi a descoberta, relativamente recente, das pinturas quinhentistas da abóbada do deambulatório que se encontravam tapadas por uma caiação antiga e que, juntamente com a charola no seu todo, foram alvo de um prolongado processo de restauro (iniciado no final da década de 1980 e terminado em 2013[8][9]). Finalmente foi revelado um tesouro há muito escondido: as pinturas do período manuelino, "cuja visão transforma notavelmente a leitura do espaço interior da charola".[6][10]
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Jorge Afonso, Entrada de Jesus em Jerusalém
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Jorge Afonso, Sermão de Santo António aos peixes, c. 1536
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Profeta Sofonias, obra de Olivier de Gand
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São Jerónimo, obra de Olivier de Gand
Notas
- ↑ MN - Monumento Nacional, Decreto de 10-01-1907, DG, 1.ª série, n.º 14 de 17 janeiro 1907, Decreto de 16-06-1910, DG, 1.ª série, n.º 136 de 23 junho 1910; Património Mundial - UNESCO, 1983
Referências
- ↑ Visitantes dos Museus crescem 10%
- ↑ a b c Pereira 2011, pp. 244-248.
- ↑ a b Carlos Emanuel Santos. «A Charola Templária de Tomar – Uma Construção Românica entre o Oriente e o Ocidente». Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL. Consultado em 30 de agosto de 2016
- ↑ a b Pereira 1995, pp. 341, 342.
- ↑ a b Pereira 2011, pp. 447-452.
- ↑ a b c «Convento de Cristo». SIPA / DGCP. Consultado em 20 de agosto de 2016
- ↑ Pereira 2009, pp. 13-16.
- ↑ Joana Gorjão Henriques. «Charola de Tomar reabre». Jornal Público. Consultado em 22 de agosto de 2016
- ↑ «A Charola do Convento de Cristo – História e Restauro». DGCP – Loja. Consultado em 22 de agosto de 2016
- ↑ «Convento de Cristo: Restauro da Charola» (PDF). DGPC. Consultado em 23 de agosto de 2016
- Bibliografia
- Pereira, Paulo (2009). Convento de Cristo, Tomar (guia oficial). Lisboa: SCALA; Ministério da Cultura; IGESPAR. ISBN 978-1-85759-563-5
- Pereira, Paulo (2011). Arte Portuguesa: História Essencial. Lisboa: Círculo de Leitores. ISBN 978-989-644-153-1
- Pereira, Paulo (dir.) (1995). História da Arte Portuguesa, primeiro volume: da pré-história ao «modo» gótico. Lisboa: Círculo de Leitores. ISBN 972-42-1143-6
Ligações externas
editar- A Charola do Convento de Cristo, Visita Guiada - Templários no Convento de Cristo, em Tomar (Extrato de Programa Cultural), por Paula Moura Pinheiro, RTP, 2014
- «A Charola do Convento de Cristo – História e Restauro». DGPC
- «Carlos Emanuel Santos, A Charola Templária de Tomar – Uma Construção Românica entre o Oriente e o Ocidente». Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL
- «Convento de Cristo / Mosteiro de Cristo». SIPA – DGPC
- «Convent of Christ in Tomar». UNESCO