Cristóvão Falcão
Cristóvão Falcão (c. 1512/15 - 1557)[a] foi um poeta e diplomata português. Por vezes o seu nome é referido como tendo sido Cristóvão Falcão de Sousa ou Cristóvão de Sousa Falcão. O nome próprio aparece por vezes com a grafia arcaica de Christóvão.

Biografia
editarSupõe-se que Cristóvão Falcão terá nascido em Portalegre, pois a sua família tinha residência nesta cidade.[1] Era da nobilitada família Vaz de Almada e descendente de John Falcon (ou Falconet),[2] um dos nobres ingleses que se instalaram em Portugal em 1386, aquando do casamento da filha do 1º Duque de Lencastre, Filipa de Lencastre, com o rei D. João I. O pai, João Vaz de Almada (Sousa Falcão), casado com Brites Godinho, era um dignitário que foi capitão na feitoria de S. Jorge da Mina e outros mais cargos, mas mesmo assim este filho morreu sem grandes recursos, como tinha acontecido durante grande parte da sua vida.[1][2]
Cristóvão Falcão foi educado a partir dos 9 anos no Paço Real, em Lisboa, onde estudou Belas-Artes.[1] Foi discípulo e amigo dos grandes poetas quinhentistas portugueses Bernardim Ribeiro e Francisco de Sá de Miranda, mas abandonou a poesia e enveredou por uma carreira diplomática. Integrou a embaixada portuguesa enviada por D. João III a Roma em 1542.[b][1][2][3] Após regressar a Portugal, a 31 de Março de 1545 é enviado como capitão para a fortaleza de Arguim, na actual Mauritânia, de onde regressaria em 1547. Algum tempo depois foi preso por agressão a um fidalgo. Sairá da prisão com uma carta de perdão obtida em 1551, e terá casado com Isabel Caldeira em 1553. Não teve filhos com ela, mas conhece-se um filho ilegítimo com o seu nome, o qual viria a ser capitão da Madeira. Nada mais se conhece da sua vida após o seu casamento.[1]
A paixão de juventude
editarAcerca deste episódio da vida de Cristóvão Falcão, as fontes onde este texto se baseia divergem ligeiramente.
A ela chamavam Maria | |
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A edição de 1911 da Encyclopædia Britannica[2] refere que Cristóvão se teria apaixonado na sua infância por Maria Brandão, uma jovem muito bela, herdeira de grande fortuna, com quem teria chegado a casar secretamente em 1526, mas a oposição dos pais levou a que o casamento fosse anulado. O orgulho familiar levou o pai de Cristóvão a pô-lo em sua casa sob vigilância apertada durante 5 anos, enquanto Maria foi obrigada pelos seus pais a enclausurar-se no Mosteiro do Lorvão, que aí se esforçaram por convencê-la que o pretendente estaria mais interessado na sua fortuna do que na sua pessoa. A insistência dos argumentos e a promessa de um bom casamento acabaram por convencer Maria a sair do mosteiro para casar em 1534 com Luís de Silva, capitão de Tânger.
Esta história teria sido a inspiração de Cristóvão para a obra poética pela qual é mais conhecido, Crisfal.
O texto que se encontra no website do Projecto Vercial[1] refere mais simplesmente que o jovem Cristóvão Falcão esteve preso durante 5 anos por ter casado com uma menor. Logo que saiu da prisão, procurou a sua amada em Lorvão. Foi nessa altura que começou a escrever o Crisfal, onde canta a sua paixão arrebatadora. Uma das razões para a integração de Cristóvão na embaixada a Roma como agente particular de D. João III teria sido evitar mais escândalos.
O poema Crisfal
editarEsta é a obra mais conhecida de Cristóvão Falcão, a ponto de se confundir com o nome do autor. É provável que Crisfal seja um criptónimo de Cristóvão Falcão.
Crisfal, Chrisfal ou Trovas de Crisfal, é uma écloga (poema pastoril) com 1015 versos (no texto do folheto publicado por Oliveira Santos e editado por Cohen; vide infra) que conta a história dos jovens pastores Maria Brandão e Crisfal, que se amam desde a infância, mas são separados porque os pais da jovem a levam para um lugar distante. «Escrito em harmoniosa redondilha maior, é talvez o mais expressivo exemplo da adaptação da poesia bucólica grega e latina à sensibilidade portuguesa»..[4] É um poema impregnado de saudade[c], de emoções ternas e puras, glorificadas em versos escritos numa linguagem directa, mas de timbre requintado,,[2] onde perpassa uma sensualidade picante e um realismo por vezes atrevido.[carece de fontes] A obra colocou o Cristóvão Falcão numa posição única na literatura portuguesa e teve uma influência considerável em poetas posteriores, nomeadamente Camões.[2]
Polémica sobre a autoria de Crisfal
editarAté à publicação em 1908 por Delfim de Brito Monteiro Guimarães de "Teófilo Braga e a lenda do Crisfal",[5] ninguém questionava a autoria de Crisfal. Nesta obra defende-se a tese de que Crisfal teria sido escrito por Bernardim Ribeiro, que se teria inspirado na paixão de juventude do seu amigo Cristóvão Falcão. Segundo o mesmo Delfim Guimarães, Cristóvão Falcão não seria sequer poeta. Entre outros argumentos, é argumentado que as publicações do século XVI das obras atribuídas a Cristóvão Falcão são anónimas e que a edição de Ferrara inclui as obras de Bernardim Ribeiro. Esta tese foi contestada ao seu tempo, e foi refutada por estudos mais recentes. Supõe-se que o anonimato terá sido uma opção de Cristóvão Falcão por causa da natureza pessoal do poema e das alusões nele feitas. Além disso, há referências a Cristóvão Falcão como autor do poema em escritos de vários autores antigos, nomeadamente do seu contemporâneo Diogo de Couto.[1][2][3]
Publicações
editar- 1543-1546: Trovas de Chrisfal é publicado anonimamente num folheto (menos correctamente, numa "folha volante").
- 1554: Trovas de Crisfal aparece publicado juntamente com as obras de Bernardim Ribeiro num livro impresso em Ferrara por Abraham Usque; com atribuição ambígua a Cristóvão Falcão ("Hũa muy nomeada e agradauel Egloga chamada Crisfal que diz. Entre Sintra a muy prezada. Que dizem ser de Cristouã falcam. Ho que parece alludir ho nome da mesma Egloga").
- 1559: Edição de Crisfal, baseada na edição de Ferrara, é impressa em Colónia.
- 1893: Augusto Epifânio da Silva Dias publica no Porto uma edição crítica, Obras de Christovão Falcão, que inclui Crisfal e outro poema, A Carta.
- 1896: Uma das Cantigas Esparsas é publicada na Revista Lusitana (vol. 4, pp. 142-f 79, Lisboa), num artigo de Augusto Epifânio da Silva Dias intitulado Fragmento de um Cancioneiro do Século XVI.
- 1933: Edição de Crisfal organizada por Sousa da Silveira no Rio de Janeiro.
- 1945: Sousa da Silveira edita Textos Quinhentistas no Rio de Janeiro, que inclui Crisfal.
- 1962: Edição em Lisboa de Crisfal prefaciada e anotada por Manuel Rodrigues Lapa.
- 1965: Guilherme G. de Oliveira Santos publica em Lisboa uma reprodução fac-simile da 1ª edição (o folheto sem data nem lugar de publicação) de Trovas de Crisfal.
- 1995: Rip Cohen edita Trovas de Chrisfal segundo o texto do folheto, em suplemento especial da revista da Fundação Calouste Gulbenkian Colóquio/Letras.
Notas
editar- [a] ^ As datas de nascimento e morte são incertas, até no ano. Algumas fontes referem que nasceu em 1512, outras entre 1515 e 1518. Supõe-se que tenha morrido entre 1555 e 1557.
- [b] ^ A missão de Cristóvão Falcão nesta embaixada era utilizar a sua relação familiar com o seu primo marquês de Aguilar, o influente embaixador de Carlos V junto do papa, para impedir a nomeação de D. Miguel da Silva, bispo de Viseu como cardeal. Este fugira de Portugal para Roma em 1540 contra a vontade do rei e este pensou em puni-lo por isso. Esta tese está em contradição com o texto do artigo da Wikipedia sobre D. Miguel da Silva, no qual é referido 1541 como o ano em que D. Miguel ascendeu a cardeal, enquanto a embaixada de D. João III teria sido enviada no ano seguinte.[3]
Referências
- ↑ a b c d e f g «Cristóvão Falcão». Projecto Vercial. Universidade do Minho. Consultado em 18 de novembro de 2009. Cópia arquivada em 18 de novembro de 2009
- ↑ a b c d e f g h Este artigo incorpora texto (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público. Existem pelo menos duas cópias na web deste artigo, uma em HTML, em 1911encyclopedia.org, e um fac-símile no Internet Archive (pág. 137 no original, pág 149 na versão online).
- ↑ a b c «FALCÃO, Falcão». Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Editorial Enciclopédia Lda, citada na Biblioteca Digital do Alentejo. Consultado em 19 de novembro de 2009. Cópia arquivada em 19 de novembro de 2009
- ↑ Leonel de Oliveira, ed. (1997). «Crisfal». Nova Enciclopédia Larousse. 7 3892 ed. Lisboa: Círculo de Leitores e Larousse. 2087 páginas
- ↑ Guimarães, Delfim (1909). «Teófilo Braga e a lenda do Crisfal». Lisboa: Livraria Editora Guimarães & Cª, Project Gutenberg
- Leonel de Oliveira, ed. (1997). «Falcão (Cristóvão)». Nova Enciclopédia Larousse. 10 3895 ed. Lisboa: Círculo de Leitores e Larousse. 2906 páginas
Bibliografia
editar- Teófilo Braga, Bernardim Ribeiro e o Bucolismo, Porto, 1897.
- Cohen, Rip (1995). «A estrutura formal das Trovas de Chrisfal: epistemologia do sonho ou cantiga de is-ão?». Colóquio/Letras. 135. Consultado em 19 de novembro de 2009