Facção Central
Facção Central é um grupo brasileiro de rap formado em 1989 na cidade de São Paulo. Conhecido pelo estilo agressivo e pelas letras que abordam temas como violência social, tráfico de drogas, e crítica ao sistema, o grupo tornou-se um dos nomes mais emblemáticos da vertente gangsta rap no país.[1][2] Sua formação mais reconhecida contou com os rappers Dum-Dum e Eduardo Taddeo, além do DJ Erick 12.[1]. Eduardo, como líder e principal letrista do grupo, desempenhou um papel crucial na construção da identidade do grupo e de seus comentários sociais.[3] Após sua saída do grupo em 2013, o Facção Central seguiu por um período sob a liderança de Dum-Dum, até sua morte em maio de 2023. No ano anterior após a morte de Dum-Dum seu irmão conhecido pelo alcunha Nino FC continuou com o legado do grupo.[4][5]
Facção Central | |
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Show do Facção Central, realizado em Bauru, SP | |
Informações gerais | |
Origem | São Paulo, SP |
País | Brasil |
Gênero(s) | |
Período em atividade | 1989−2023 |
Gravadora(s) | Sky Blue Music (1989–2016) |
Afiliação(ões) | A286 Racionais MC's |
Integrantes | Nino FC |
Ex-integrantes | Dum-Dum Eduardo DJ Erick 12 Mag Jurandir Cesinha Serginho Wilson DJ Garga DJ Marquinhos Smith-E DJ Binho Moysés DJ Pantera |
História
editarO Facção Central foi formado em 31 de maio de 1989, na zona central de São Paulo. Inicialmente, o grupo era composto pelos membros Jurandir, Cesinha, Serginho, Wilson e Mag.[6] Nos primeiros anos, a formação do grupo passou por várias mudanças.[7] Em 1995, a formação mais estável surgiu, Dum-Dum e Eduardo Taddeo como cantores fixos e Garga como DJ.[1] Eduardo também assumiu o papel de compositor das letras. Essa formação lançou o primeiro álbum do grupo, Juventude de Atitude, em 1995. O álbum marcou características-chave que definiriam a atuação do grupo: instrumentais sampleados de gêneros musicais afro-americanos, como R&B, soul e funk (que tiveram forte influência sobre o rap), letras agressivas, uma representação das realidades periféricas de São Paulo e o compromisso em conscientizar as comunidades marginalizadas.[8] Dentre as faixas de destaque estava "Roube Quem Tem", que se tornou um símbolo da mensagem do grupo.[8]
Garga deixou o Facção Central entre 1997 e 1998, sendo substituído por Erick, que também contribuiu para o segundo álbum de estúdio do Facção Central, Estamos de Luto, lançado em 1998.[8] Esta obra apresentou um ritmo mais lento em comparação com os trabalhos anteriores, tendo músicas mais longas e o tom geral de luto e desesperança.[8] O disco também marcou o início da ascensão do Facção Central na cena do rap brasileiro, com faixas como "Brincando de Marionetes" e "Detenção sem Muro" ganhando popularidade.[8] Esses raps, juntamente com o álbum como um todo, destacaram a reflexão mais profunda do grupo sobre as injustiças sociais, enquanto continuavam suas críticas à opressão sistêmica que afeta as comunidades marginalizadas do Brasil.[8]
Em 1999, o grupo lançou Versos Sangrentos, que contou com a controversa faixa "Isso aqui é uma guerra". O videoclipe dessa música foi censurado pelo Ministério Público de São Paulo por supostamente promover o crime, gerando uma reação nacional.[8] Redes de TV, incluindo a MTV Brasil, retiraram o vídeo do ar.[9][10] No entanto, o grupo argumentou que a mensagem do vídeo era de condenação ao crime, evidenciado pelo fato de os criminosos serem punidos no final do clipe.[11][9] Apesar da polêmica, a música e o álbum solidificaram ainda mais a reputação do Facção Central de confrontar a violência policial e as questões sistêmicas, com letras mais agressivas e críticas ao judiciário, às forças policiais, ao estado e às elites brasileiras.[8] Faixas como "Versos Sangrentos (A Minha Voz Está no Ar)", "12 de Outubro" e "Anjo da Guarda x Lúcifer" se tornaram hinos do rap brasileiro, com sua representação ácida da periferia paulistana marcando a trajetória do grupo nos anos seguintes.[8]
Dois anos depois, o grupo lançou o álbum duplo A Marcha Fúnebre Prossegue, uma resposta direta à censura que o Facção Central havia enfrentado devido à faixa "Isso Aqui é Uma Guerra". O álbum incluiu músicas que criticavam as tentativas do estado de silenciar o grupo e sua mensagem.[8] Faixas como "A Marcha Fúnebre Prossegue", "Sei Que os Porcos Querem Meu Caixão", "Discurso ou Revólver" e "Desculpa Mãe" continuaram a abordagem crítica do grupo sobre a violência sistêmica, ao mesmo tempo em que expandiam sua narrativa além de São Paulo.[8] O álbum passou a fazer comparações entre as realidades periféricas de São Paulo e as de outras partes do Brasil, além de introduzir referências históricas e políticas para explicar por que “a marcha fúnebre prossegue” nas regiões empobrecidas.[8] Pouco depois, Erick 12 deixou o grupo por motivos particulares e também relacionados às letras de Eduardo Taddeo e foi substituído pelo DJ Marquinhos.[9]
Em 2003, o Facção Central lançou Direto do Campo de Extermínio, que apresentou uma nova narrativa, mesclando diferentes temporalidades e realidades tanto dentro quanto fora do Brasil.[12] O título do álbum evocava os horrores dos campos de concentração nazistas, associando a exclusão social enfrentada pelas comunidades marginalizadas do Brasil às atrocidades de Auschwitz.[12] Uma das faixas principais, "São Paulo Auschwitz", enfatizou essa comparação dramática. O álbum incluiu músicas de destaque como "O Menino do Morro", "Hoje Deus Anda de Blindado", "Eu Não Pedi Pra Nascer", "O Homem Estragou Tudo" e "Estrada da Dor 666", refletindo o profundo desespero e a crítica às estruturas sociais.[12] Também fez parte do álbum a faixa "Dias Melhores Não Virão", um reconhecimento sombrio da difícil realidade enfrentada pela periferia.[12] A canção "O Menino do Morro" recebeu o prêmio de "Melhor Música do Ano" no Hútuz, o principal prêmio do hip-hop brasileiro na época, bem como o álbum.
Em 2006, o grupo lançou O Espetáculo do Circo dos Horrores, com um foco ainda maior em questões raciais e na história da resistência negra. Esta obra marcou uma mudança significativa, pois o grupo passou a incorporar referências a figuras e movimentos históricos negros, abordando o racismo e a marginalização enfrentados pelas pessoas de ascendência africana ao longo da história.[12] Faixas como "Castelo Triste", "Apartheid no Dilúvio de Sangue", "Abismo das Almas Perdidas", "Front de Madeirite" e "Tecla Pause" exploraram temas de injustiça racial e exclusão.[12] O álbum, que foi o último a contar com a participação de Eduardo Taddeo, também chamou a atenção para o legado dos quilombos no Brasil, alinhando a luta desses movimentos com as batalhas mais amplas pela igualdade.[12] Esse trabalho foi crucial para destacar a crescente consciência social do grupo.[12] A faixa "Mais Tarde" venceu o prêmio de "Melhor Música do Ano" no Hútuz, e o grupo também conquistou o prêmio de "Melhor Álbum do Ano" no mesmo evento.[13]
Em 2013, Eduardo deixou o grupo devido a divergências internas, e Moysés o substituiu como o segundo rapper principal.[14] Durante a permanência de Moysés, o Facção Central colaborou com o Racionais MCs em duas músicas e se apresentou com Dum-Dum para celebrar o 25º aniversário deste grupo de rap. No entanto, Moysés deixou o grupo em 2014 após desentendimentos artísticos com Dum-Dum.[14][15] A partir de então, Dum-Dum passou a ser o principal membro responsável pelas atividades do grupo.
Em 2015, o Facção Central lançou o álbum A Voz do Periférico, que contou com colaborações dos rappers Smoke, Badu, DJ Pulga, Crônica Mendes, WGI (Consciência Humana), Anália Patrícia (irmã de Eduardo Taddeo e esposa de Dum-Dum) e Branco P9.[14] Este trabalho marcou uma mudança substancial na direção musical do grupo, particularmente com o aumento das influências gospel, representando uma ruptura com as críticas anteriores ao cristianismo, vistas em faixas como "Espada no Dragão", de O Espetáculo do Circo dos Horrores, que criticavam a evangelização forçada e a concentração de poder entre líderes religiosos.[16] Dum-Dum explicou em uma entrevista no YouTube, em 2015, que um novo projeto do grupo, Na Cena, em parceria com Moysés, Cabeção, Lauren e DJ Celo, teria uma abordagem menos violenta e mais positiva, com menos uso de palavrões, destacando que a vida na periferia, embora difícil, não era tão desesperadora quanto muitos imaginavam. Enquanto o Facção Central mudava de postura, Eduardo Taddeo, agora com carreira solo, continuava a manter o discurso radical e afiado que havia definido o rap do grupo nos anos anteriores.[17]
Em 2020, foi lançado Inimigo Nº1 do Estado, produzido pelo DJ Pantera. Em abril de 2023, Dum-Dum sofreu um AVC e faleceu algumas semanas depois, marcando o fim de uma era para o Facção Central.[4][5]
Discografia
editarÁlbuns de estúdio
editar- 1995 – Juventude de Atitude
- 1998 – Estamos de Luto
- 1999 – Versos Sangrentos
- 2001 – A Marcha Fúnebre Prossegue
- 2003 – Direto do Campo de Extermínio
- 2006 – O Espetáculo do Circo dos Horrores
- 2015 - A Voz do Periférico
- 2020 - Inimigo Nº1 do Estado
Álbuns ao vivo
editarColetâneas
editar- 1993 - Movimento Rap Vol. 2 (Vários Artistas)
- 1999 - Família Facção (Vários Artistas)
Prêmios
editarAno | Prêmio | Categoria | Ref |
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2003 | Prêmio Hutúz | Música do Ano | |
2003 | Prêmio Hutúz | Álbum do Ano | |
2006 | Prêmio Hutúz | Grupo ou Artista Solo | [18] |
2009 | Prêmio Hutúz | Melhores grupos ou artistas solo da década |
Referências
- ↑ a b c Gomes 2019, pp. 15-16.
- ↑ Camargos 2022.
- ↑ Gomes 2019, pp. 10, 14, 37-39.
- ↑ a b Nicoceli 2023.
- ↑ a b Decaris 2023.
- ↑ Mauricio 2008.
- ↑ Gomes 2019, pp. 31-32.
- ↑ a b c d e f g h i j k l Gomes 2019, p. 16.
- ↑ a b c Carvalho 2007.
- ↑ Leite 2000.
- ↑ Gomes 2019, pp. 42-43.
- ↑ a b c d e f g h Gomes 2019, p. 17.
- ↑ Folha de S.Paulo 2006.
- ↑ a b c Gomes 2019, p. 34.
- ↑ Rap Nacional 2014.
- ↑ Gomes 2019, p. 35.
- ↑ Gomes 2019, p. 36.
- ↑ Rap Nacional 2006.
Bibliografia consultada
editar- Camargos, Roberto (2017). «Relatos sanguinários e sentimentos indigestos no rap de facção central». Música Popular em Revista (1): 70–94. ISSN 2316-7858. doi:10.20396/muspop.v5i1.13126. Consultado em 21 de novembro de 2022
- Carvalho, Luiz Maklouf (10 de julho de 2007). «O bagulho é doido, tá ligado?». Revista Piauí. Consultado em 20 de dezembro de 2024
- Decaris, Fernanda. «Facção Central: morre Dum Dum aos 54 anos». Rolling Stone. Consultado em 13 de maio de 2023
- Gomes, Matheus de Andrade (16 de agosto de 2019). “Os locutores do inferno”: representações de violências no rap do Facção Central (1995-2006) (PDF) (Tese). Universidade de Brasília. Consultado em 20 de dezembro de 2024
- Leite, Fabiane (29 de junho de 2000). «Justiça veta vídeo de rap do grupo Facção Central na MTV». Folha de S.Paulo. Consultado em 21 de dezembro de 2024. Arquivado do original em 1 de novembro de 2014
- Mauricio, Angelo (25 de outubro de 2008). «MAG– Facção Central, carreira solo e críticas ao rap brasileiro». Movin Up. Consultado em 21 de dezembro de 2024
- Nicoceli, Artur (12 de maio de 2023). «Morre rapper Dumdum, integrante do grupo Facção Central, aos 54 anos». G1. Consultado em 21 de dezembro de 2024
- «Facção Central vence prêmio 2009 no Hútuz». Folha de S.Paulo. 25 de novembro de 2006. Consultado em 21 de dezembro de 2024
- «Premiados do Hútuz Facção Central um dos melhores grupo de Rap do ano leva prêmio». Portal Rap Nacional. 14 de outubro de 2006. Consultado em 21 de dezembro de 2024. Arquivado do original em 5 de novembro de 2006
- «Moysés anunciou sua saída do Facção Central». Portal Rap Nacional. 4 de agosto de 2014. Consultado em 21 de dezembro de 2024. Arquivado do original em 8 de agosto de 2014