Debate Soares-Cunhal
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O debate Soares-Cunhal foi um debate, ocorrido no dia 6 de novembro de 1975, transmitido na RTP1, no programa "Responder ao País", em vésperas do 25 de novembro entre o então secretário-geral do Partido Socialista, Mário Soares e o então secretário-geral do Partido Comunista Português, Álvaro Cunhal. Este debate foi o primeiro da televisão portuguesa a ser transmitido e o mais longo de sempre, pois teve uma duração de 3 horas 40 minutos e 52 segundos, e foi moderado por José Carlos Megre e Joaquim Letria[1]. Este debate também é considerado como o "pai dos debates"[2].
Responder ao País - Frente a Frente… Mário Soares e Álvaro Cunhal | |
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Outros nomes | Mário Soares vs. Álvaro Cunhal |
Moderação | José Carlos Megre e Joaquim Letria |
Localização | Estúdios da RTP, Lumiar |
Data | 6 de novembro de 1975 |
Participantes | Mário Soares (PS) Álvaro Cunhal (PCP) |
Duração | 3 horas 40 minutos e 52 segundos |
Emissora(s) | RTP1 |
Eventos relacionados | Caso República Independência de Angola Golpe de 25 de Novembro de 1975 |
Site oficial | Frente a Frente… Mário Soares e Álvaro Cunhal – I Parte na RTP Arquivos Frente a Frente… Mário Soares e Álvaro Cunhal – II Parte na RTP Arquivos |
Antecedentes
editarDevido ao clima político vivido pelo Processo Revolucionário em Curso (ou PREC), reunir na televisão os líderes dos principais partidos de esquerda do país era importante na tentativa de trazer consenso entre o Partido Socialista e Partido Comunista Português, na altura, antagónicos que, apesar de defenderem o socialismo para Portugal, o caminho traçado por cada um era completamente distinto[3][4].
Alguns meses antes, em julho[5], os dois secretários-gerais já se tinham encontrado frente-a-frente para um debate; no entanto, esse debate havia sido transmitido apenas na ORTF e para os telespetadores franceses[6].
De acordo com Joaquim Letria, numa entrevista concedida à revista Sábado, o jornalista foi obrigado a mentir para que Mário Soares e Álvaro Cunhal aceitassem o convite, dizendo a um que o outro já tinha aceite[7]. Segundo o próprio, a dificuldade em reunir Soares e Cunhal obrigou a que esta estratégia fosse usada[7].
O debate
editarO frente-a-frente teve dois blocos com um intervalo a meio, os jornalistas colocaram questões aos políticos na primeira parte e, na segunda, os oponentes puderam fazer perguntas um ao outro e responder livremente.
A conversa foi longa e densa. Falou-se de democracias ocidentais vs. democracias populares, de socialismo e liberdades, de revolução e contra-revolução, de reformas sociais, de liberdade de imprensa, de ódio e intolerância. O estúdio era cinzento, as mesas dos convidados feias, os discursos não tinham soundbytes como os conhecemos hoje e os jornalistas fumavam em direto - aliás, José Carlos Megre abriu as hostilidades com um cigarro aceso[8].
Foi neste debate que ficou conhecida a célebre frase "Olhe que não, olhe que não": Mário Soares acusou o líder do PCP de querer instituir uma ditadura em Portugal. Ao confrontado com esta afirmação, Cunhal disse «Olhe que não, doutor, olhe que não», a frase foi proferida sensivelmente meia hora após o início da emissão e a mesma acabaria por entrar no léxico político nacional[9].
Durante a segunda parte do debate, um dos moderadores do debate, José Carlos Megre, anunciou que junto da sede central do Partido Socialista, na Rua da Emenda, tinha rebentado um petardo, mas que não provocou quaisquer estragos[3][10].
Apesar da hora avançada em que o debate terminou (perto da 1h30 da madrugada), num dia útil (quinta-feira), cerca de três milhões de portugueses seguiram o debate pela televisão e pela rádio, de acordo com uma estimativa do Jornal de Notícias da época e, segundo o jornal A Luta, as ruas "despovoaram-se completamente” e só duas das então 20 salas de cinema de Lisboa tinham números de “assistência normal"[3][11]. Um dos moderadores do debate, José Carlos Megre, acredita que "foi o programa mais visto de sempre da televisão portuguesa"[7].
Legado
editarAlgumas horas após o fim do debate, às 4h40, um grupo de 60 paraquedistas, por ordem do primeiro-ministro Pinheiro de Azevedo e do Conselho da Revolução, bombardeou os emissores de onda média da Rádio Renascença, ocupada pela extrema-esquerda[3][12][13][14].
Algumas semanas depois, estas duas perspetivas iriam traduzir-se nos acontecimentos do 25 de Novembro[3][14].
O debate foi recriado 22 anos depois, em 1997, no Instituto de Defesa Nacional, transmitido pela SIC[15] e reposto na RTP1 nos dias 7 e 8 de janeiro de 2017, aquando a morte de Mário Soares[16][17].
Na cultura popular
editarLiteratura
editar- «Olhe que não, olhe que não!» Os dois debates televisivos de 1975 entre Mário Soares e Álvaro Cunhal (2020, Tinta da China), de José Pedro Castanheira e José Maria Brandão de Brito.[18]
Televisão
editar- Depois do Adeus (2013) - tema do episódio 12[19]
Ligações externas
editarReferências
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «Frente a frente entre Mário Soares e Álvaro Cunhal faz hoje 40 anos e durou quase quatro horas». Frente a frente entre Mário Soares e Álvaro Cunhal faz hoje 40 anos e durou quase quatro horas. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «Debates que marcaram a democracia portuguesa». Debates que marcaram a democracia portuguesa. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ a b c d e Pinheiro, Miguel. «As 3 horas 40 minutos e 52 segundos mais importantes da vida de Soares». Observador. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «O debate com Cunhal». O debate com Cunhal. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «Os debates». comunicar-politica.blogs.sapo.pt. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «06824.174.27388». Casa Comum, Fundação Mário Soares. Diário de Lisboa. 6 de novembro de 1975. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ a b c «A mentira do debate entre Soares e Cunhal». www.sabado.pt. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «SIC Notícias | Episódio "Olhe que não" entre Soares e Cunhal». SIC Notícias. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ «História do debate «quente» como o país pós-revolucionário». TVI24. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ «Debate entre Cunhal e Soares | Memórias da Revolução | RTP». Memórias da Revolução. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «06824.174.27389». Casa Comum, Fundação Mário Soares. Diário de Lisboa. 7 de novembro de 1975. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «06824.174.27389». Casa Comum, Fundação Mário Soares. Diário de Lisboa. 7 de novembro de 1975. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ «06824.174.27389». Casa Comum, Fundação Mário Soares. Diário de Lisboa. 7 de novembro de 1975. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ a b «Memórias da Revolução - A Revolução na Televisão – O debate Cunhal-Soares». memoriasdarevolucao.pt. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ Mario Soares vs Alvaro Cunhal 1997, 1997, consultado em 25 de março de 2023
- ↑ «A reposição de um debate histórico». Semanario SOL. Consultado em 26 de agosto de 2020
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «Frente-a-frente: Mário Soares / Álvaro Cunhal - Debates - RTP». www.rtp.pt. Consultado em 27 de agosto de 2020
- ↑ ««OLHE QUE NÃO, OLHE QUE NÃO!»». Tinta da China. Consultado em 3 de dezembro de 2023
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «"É apenas fumaça!" - de 9 a 13 de novembro de 1975 - Depois do Adeus - Séries Nacionais - RTP». www.rtp.pt. Consultado em 3 de dezembro de 2023