História-mundo
A história-mundo desenvolveu-se com o intuito de escrever a história do mundo e de sua modernidade, incluindo seus episódios considerados mais relevantes, seja de cunho político, cultural, econômico ou social, a partir de longos espaços de tempo.[1] Além de ser muitas vezes factual, a história-mundo busca analisar os eventos mundiais através de uma perspectiva ocidental para compreender a ascensão do ocidente, ainda que nas suas relações com as periferias.[1]
A chamada história-mundo pode ser encontrada já no século XIX nos estudos de Hegel sobre da filosofia da história. O termo aparece em diversos de seus trabalhos, como em Lectures on the Philosophy of World History[2] e Filosofia da História.[3] Ao sustentar a importância de estudar a história mundial, Hegel caracterizou-a como tendo seu início na Ásia e seu fim na Europa, continente entendido por ele como provido do domínio da razão.[3] Se torna evidente a perspectiva do que foi mais tarde chamado de eurocentrismo na filosofia hegeliana ao tratar da história-mundo a partir do caracterização do ocidente cristão-germânico como o caminho a ser seguido para o alcance do progresso das civilizações.[4]
No século XX, após as duas Guerras Mundiais, os estudos na areá da história-mundo começaram a emergir em profusão e trabalhos como The Rise of The West: A history of the Human Community[5], de William H. McNeill, passaram a impulsionar as produções acadêmicas na área. Ao tentar narrar o avanço do ocidente através da longa duração, o livro caracteriza a metodologia utilizada pela história-mundo, abordando desde a história Antiga do Oriente Médio em 500 a.c., perpassando pela história da América espanhola, do Brasil, China e Japão e chegando nos acontecimentos do mundo ocidental dos séculos XVIII e XX. Mais tarde, a década de 1960 marca o auge das discussões acadêmicas acerca da história-mundo, com influências de trabalhos como os de David Thomson, Historia mundial desde 1914 até 1950.[6] Após a década de 1990, discussões acerca da história-mundo já haviam conseguido desenvolver seus centros de pesquisa e organizações, como exemplo a World History Association, no Hawaí, que desenvolveu o Journal of World History,[7] e a Network of Global and World History Organizations, na Universidade de Cambridge.[8]
Diferença entre História global e História-mundo =
editarAbordagens historiográficas capazes de ir além de passados históricos europeus vêm sendo pensadas há séculos. As categorias história-mundo e história global, por exemplo, desenvolveram-se no sentido de incentivar uma escrita da História capaz de abranger diversos espaços do globo para além das fronteiras europeias. Porém, as duas abordagens divergem entre si, principalmente no que diz respeito às suas características conceituais e metodológicas, obtendo atualmente suas próprias problemáticas, áreas, núcleos de pesquisas, revistas, associações e centros historiográficos nos diversos espaços acadêmicos.[9]
A história-mundo desenvolveu-se com o intuito de escrever a história do mundo e de sua modernidade, incluindo seus episódios considerados mais relevantes, seja de cunho político, cultural, econômico ou social, a partir de longos espaços de tempo.[1] Além de ser muitas vezes factual, a história-mundo busca analisar os eventos mundiais através de uma perspectiva ocidental para compreender a ascensão do ocidente, ainda que nas suas relações com as periferias. Já a história global, a qual se estabeleceu como categoria na década de 1990 influenciada pelo fenômeno da globalização mundial, escreve a história dos países do globo a partir de um viés que busca abranger as categorias de análise para além do Estado-nação, distanciando-se da perspectiva eurocêntrica. Outra diferença entre as duas categorias diz respeito às suas metodologias. A história-mundo se interessa pela perspectiva de inclusão dos países do mundo a partir de um viés comparativo, porém não analisa as interações espaciais sob a perspectiva das conexões, como faz a história global.[1]
Ver também
editarReferências
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- ↑ Hegel 1980.
- ↑ a b Hegel 2004.
- ↑ Raskin 2017, p. 179.
- ↑ McNeill 2009.
- ↑ Thomson 1974.
- ↑ Lazaro 2018.
- ↑ Network 2008.
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