História do Lesoto

A História do Lesoto remonta a 4000 anos. O atual Lesoto surgiu como um único estado sob o rei Moshoeshoe I em 1822. Após um período sob domínio colonial, a plena independência do Lesoto foi alcançada em 1966.

História antiga

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As montanhas do sul e leste do Lesoto (incluindo Maloti) foram ocupadas pelo povos sãs e seus ancestrais por milhares de anos, como evidenciado pela arte rupestre. Os sãs viviam como caçadores-coletores seminômades.[1]

Em algum momento, durante sua migração para o sul de uma área de dispersão terciária, os povos de língua banta vieram para colonizar as terras que agora constituem o Lesoto, bem como um território mais extenso de terras férteis que cercam o Lesoto moderno.[2] O povo amazizi é considerado um dos primeiros a colonizar o Lesoto após a expansão banta. Os zizis ganharam reputação como trabalhadores qualificados do ferro. Tanto os zizis quanto as tribos vizinhas alegaram que se originaram dos colonos bantos que mais tarde se dividiram nos ramos angunes e sotos.[3]

História medieval

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As terras altas do Lesoto atraíram migrações de caçadores-coletores locais entre 550 e 1300 durante o Período Quente Medieval, enquanto a área de Dracoberga foi completamente abandonada. Alguns dos habitantes das terras altas da época também criavam gado para alimentação.[4]

História moderna

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Perturbações severas ocorreram para o povo soto no início do século XIX. Durante a convulsão social do mfecane, os povos angunes (particularmente os zulus) saqueadores, deslocados da Zululândia, causaram estragos para os povos sotos. Estes, ao encontraram os zulus, se moverem primeiro para o oeste, em direção ao Highveld, e depois para o norte, em direção ao Transvaal. Em 1822, Moshoeshoe I consolidou uma união entre vários grupos e clãs sotos e se tornou seu rei. A unificação também significou um esforço dos sotos em retornar às suas tradicionais terras montanhosas, mais ao sul, após o mfecane.[5] A sede de poder foi estabelecida por Moshoeshoe I em Thaba Bosiu, que se tornou a primeira capital fixa da Basutolândia.[1]

Assim que os zulus passaram para o norte, os primeiros Voortrekkers chegaram, nas décadas de 1830 e 1840, alguns dos quais obtiveram hospitalidade com os sotos durante sua jornada para o norte. Porém, os Voortrekkers consideraram as tradicionais terras montanhosas dos sotos como pouco povoadas (os sotos estavam ainda dispersos justamente em função do mfecane), ao que começaram a o ocupar.[2] Assim, durante o reinado de Moshoeshoe, os primeiros atritos com os bôeres começaram, tendo em vista que estes se estabeleceram em terras tradicionais dos sotos.[1]

Entre 1858 e 1868, os habitantes da Basutolândia travam as Guerras do Estado Livre-Bassoto, contra os bôeres, sofrendo um desgastante cerco militar e uma enorme derrota. As guerras resultaram na aquisição de grandes extensões de terra dos sotos pelos colonos bôeres. O outro resultado imediato da derrota foi que em 1869 o Lesoto passa a ser o protetorado britânico da Basutolândia, e se converte em colônia diretamente ligada ao governo do Cabo em 1871.[6]

Numa tentativa de reforçar o controle sobre o território, os britânicos do Cabo impõem medidas duras contra os sotos, que reagem no que ficou conhecido como a Guerra das Armas de Bassoto, entre 1880 e 1881, em que impõem derrota aos colonizadores, conseguindo negociar um melhor estatuto para a Basutolândia como colônia sob autoridade direta de Londres em 1884. A Guerra das Armas de Basuto representou um raro exemplo de vitória militar de uma nação africana contra uma potência colonial no século XIX. A possibilidade de negociar o estatuto como Território da Coroa garantiu, em última instância, que Basutolândia não fosse incorporada à União Sul-Africana em 1910.[7]

Durante a Primeira Guerra Mundial, mais de 4.500 cidadãos da Basutolândia alistaram-se no exército britânico, a maioria dos quais serviu no Corpo de Trabalho Nativo da África do Sul, que lutou na Frente Ocidental.[1] Em 1916, a Basutolândia arrecadou mais de 40 mil libras esterlinas para o esforço de guerra. Após a entrada britânica na Segunda Guerra Mundial, novamente foi tomada a decisão de recrutar na Suazilândia, Basutolândia e Bechuanalândia.[1] Cidadãos negros destes territórios seriam recrutados para a unidade de trabalho do Corpo de Pioneiros Auxiliares Africanos (AAPC), devido à oposição dos africâneres às unidades negras armadas. A mobilização para o AAPC foi lançada no final de julho de 1941 e em outubro 18.000 soldados chegaram ao Oriente Médio. O partido anticolonial Liga dos Plebeus da Basutolândia ( Lekhorlu la Bufo) foi banido e seus líderes foram presos por exigir que o treinamento dos recrutas fosse melhorado, bem como encorajar a deserção. O AAPC realizou uma ampla gama de trabalhos manuais, fornecendo suporte logístico ao esforço de guerra dos Aliados durante as campanhas do Norte da África, Dodecaneso e Itália. Durante a Campanha da Itália, a AAPC assumiu a artilharia diante do cansaço das unidades de artilharia britânicas.[1] O esforço de guerra da Basutolândia também envolveu as mulheres, que contribuíram para o esforço de guerra em unidades industriais em Maseru para fabricação de uniformes militares.[1] A participação nas guerras formam uma relativa consciência de classe e um pensamento anticolonial dentre as forças militares da Basutolândia, que acabam por difundir tais ideais dentre a população, ponto vital no processo de independência nacional.[1]

A partir de 1948, o Partido Nacional Sul-Africano implementou as políticas de apartheid, encerrando indiretamente qualquer apoio dos sotos e/ou autoridades coloniais do Reino Unido à incorporação do país na África do Sul.[1]

Após um pedido de 1955 do Conselho da Basutolândia para legislar seus assuntos internos, em 1959 uma nova constituição deu a Basutolândia sua primeira legislatura eleita. Isso foi seguido em abril de 1965 com eleições legislativas gerais com sufrágio universal adulto nas quais o Partido Nacional Bassoto (BNP) ganhou 31 cadeiras e o Partido do Congresso da Basutolândia (BCP) ganhou 25 cadeiras, num universo de 65 cadeiras disputadas.[1]

Independência do Lesoto

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Em 4 de outubro de 1966, o Reino do Lesoto alcançou a independência total, governado por uma monarquia constitucional com um Parlamento bicameral composto por um Senado e uma Assembleia Nacional eleita.[1] O rei Moshoeshoe II assumiu a chefia do reino.[1] Os resultados das primeiras eleições pós-independência em janeiro de 1970 indicaram que o partido BNP poderia perder o controle do governo. Sob a liderança do Primeiro-Ministro Leabua Jonathan, o BNP governante recusou-se a ceder o poder ao rival partido BCP, embora se reconhecesse amplamente que o BCP havia vencido as eleições. Citando irregularidades eleitorais, o Primeiro-Ministro Leabua Jonathan anulou as eleições, declarou estado de emergência nacional, suspendeu a constituição e dissolveu o Parlamento. Em 1973, foi estabelecida uma Assembleia Nacional Interina. Com uma esmagadora maioria pró-governo do partido BNP, foi liderada pelo Primeiro-Ministro Jonathan.[1]

A partir da década de 1970, o Lesoto dá asilo político a muitos sul-africanos contrários ao regime de segregação racial do país, o apartheid.[1] A África do Sul praticamente fechou as fronteiras terrestres do país por causa do apoio do Lesoto às operações transfronteiriças do Congresso Nacional Africano (ANC). Além disso, a África do Sul ameaçou publicamente buscar uma ação mais direta contra o Lesoto se o governo de Jonathan não erradicasse a presença do ANC no país.[1] Essa oposição interna e externa ao governo combinou-se para produzir violência e desordem interna no Lesoto que eventualmente levaram a uma tomada militar em 1986.[1]

O general Justin Lekhanya dá um golpe em 1986, assumindo a chefia do governo. Os poderes executivos e legislativos foram transferidos para o Rei, que deveria agir sob o conselho do Conselho Militar, um grupo autonomeado de líderes das Forças de Defesa Reais do Lesoto (RLDF). Quatro anos depois, Lekhanya depõe o rei Moshoeshoe II e o substitui por seu filho, o príncipe Letsie. O general é deposto em 1991 e, em 1995, Letsie renuncia, levando Moshoeshoe a reassumir o trono. Com a morte do rei, em 1996, seu filho volta ao poder, como Letsie III.[1]

Eleições gerais realizadas em maio de 1998 dão vitória ao partido governista Congresso para a Democracia de Lesoto (LCD), que obtém 78 das 80 cadeiras da Assembleia Nacional, e elege seu líder Bethuel Pakalitha Mosisili para primeiro-ministro. A oposição alega fraude e protesta. A escalada de manifestações, nos meses seguintes, leva, em setembro, à intervenção militar da África do Sul, que envia 600 soldados ao país, e de Botsuana, que participa com 300 soldados. A ação militar, requisitada por Mosisili sem conhecimento do rei Letsie III — que é impedido pelo primeiro-ministro de falar à população —, deixa aproximadamente 110 mortos e prejuízo de US$ 10 milhões.

Referências

  1. a b c d e f g h i j k l m n o p q Scott Rosenberg; Richard Weisfelder; Michelle Frisbie-Fulton (2004). Historical Dictionary of Lesotho. [S.l.]: The Scarecrow Press. ISBN 0-8108-4871-6 
  2. a b «The birth and the existence of Lesotho: A diplomatic lesson». DiploFoundation. Consultado em 25 de maio de 2020. Cópia arquivada em 28 de setembro de 2020 
  3. Roland Oliver (1977). The Cambridge History of Africa, Volume 3: From c.1050 to c.1600. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-521-20981-6 
  4. Peter Mitchell; Charles Arthur; Hugo Pinto; Christian Capelli (2022). «Moshebi's shelter at fifty: reinvestigating the Later Stone Age of the Sehlabathebe Basin, Lesotho». Quaternary International. 611-612: 163–176 
  5. John Wright (1995). Mfecane Aftermath: Beyond the Concept of the 'Zulu Explosion'. [S.l.]: Wits University Press. p. 107–121. ISBN 978-1-86814-699-4 
  6. James S. Olson; Robert S. Shadle (1996). Historical Dictionary of the British Empire. [S.l.]: Greenwood Press. p. 118. ISBN 0-313-27917-9 
  7. «Gun War». Encyclopædia Britannica Online. Consultado em 15 de novembro de 2021