Retrato do Cardeal Cristoforo Madruzzo
O Retrato do Cardeal Cristoforo Madruzzo é uma célebre pintura a óleo sobre tela, realizada em 1552 por Tiziano, mestre do renascimento veneziano. Assinada e datada, a obra retrata Cristoforo Madruzzo, personagem central da história política e eclesiástica da Europa do século XVI, aos 39 anos de idade, ocasião em que ocupava o cargo de príncipe-bispo da comuna de Trento, na Itália. Encontra-se conservado no Museu de Arte de São Paulo desde 1950.[1]
Retrato do Cardeal Cristoforo Madruzzo | |
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Autor | Tiziano |
Data | 1552 |
Técnica | Óleo sobre tela |
Dimensões | 210 × 109 |
Localização | MASP, São Paulo |
Cristoforo Madruzzo
editarCristoforo Madruzzo (1512-1567) foi um importante cardeal e estadista da Itália do século XVI. Nasceu em Calavino, na condição de filho mais jovem de uma rica família de Trento. Orientado desde cedo à carreira eclesiástica, estudou direito em Pádua, recebendo as ordens menores entre 1531 e 1532, passando a seguir ao estudo da jurisprudência, em Bolonha (1532-1537).
Já na década de 1530, ocupa o cargo de procuratore della nazione germanica (“procurador da nação germânica”), sendo-lhe permitida esta titulação por ser filho de Eufemia Sporenberg, alemã de nascimento. Paralelamente, Madruzzo galga com notória avidez todas as dignidades clericais até o cardinalato, obtido no consistório de 1542, por uma nomeação in pectore do papa Paulo III. Em 1539, torna-se príncipe-bispo de Trento. Entre 1556 e 1557, assume o cargo bastante delicado de governador de Milão, em nome do imperador Carlos I de Espanha.
Defensor declarado dos interesses hispano-imperiais, Madruzzo teve um papel proeminente durante o Concílio de Trento, desempenhando função de mediador, tentando apaziguar as diferenças que opunham a Igreja Católica à coroa espanhola. Defendeu também à inclusão de assuntos do interesse de Fernando I de Habsburgo nas discussões. Em 1567, abdicou ao título tridentino em favor de seu sobrinho, Ludovico Madruzzo. Faleceu em Tivoli, em seu 66º aniversário.
O retrato
editarRetornando de uma segunda estadia em Augsburgo, em 1551, Tiziano é chamado a Trento para executar o retrato de Cristoforo Madruzzo, nos anos em que o cardeal exerce a função de príncipe-bispo da comuna. Anfitrião do Concílio de Trento, o mais longo e possivelmente mais conturbado concílio da história da Igreja, Madruzzo encomendou ao artista um imponente retrato de figura inteira, à altura das ambições políticas e eclesiásticas que almejava, e que, à época, já estava a concretizar.
Chama particularmente a atenção na obra o fato de Madruzzo não envergar a indumentária cardinalícia, embora já nomeado para a função desde 1542. É possível que o cardeal, investido da condição de mediador no conflito de interesses entre a coroa espanhola e a Igreja Católica, tenha optado por não utilizar a veste religiosa de maneira a não fomentar as disputas entre o clero e e imperador Carlos I.
Outro elemento de destaque do retrato é o relógio, não raramente presente na retratística de Tiziano. Ocupando posição preponderante na obra, ao término da diagonal esboçada pelo braço direito do retratado, o relógio foi objeto de diversas interpretações. Deve simbolizar, de forma genérica, um memento mori, uma advertência sobre a transitoriedade da glória e a necessidade da temperança. Nessa acepção, o objeto é elemento comum da pintura veneziana, comparecendo em diversos outros retratos desta escola (como no Retrato de Alvise Contarini, por Paris Bordone).
Para Harold Wethey, a obra era originalmente maior, tendo sido reduzida na parte inferior e no lado direito.[2] No alto do quadro, na parte direita, encontra-se a indicação da data (repetida também sobre o relógio. “1.5.5.2.”) e da idade do retratado (“ANNO D[omi]NI. MDLII / AETATIS SUAE XXXVIIII"), além da assinatura de Tiziano (“TITIAN FECIT”). Um restauro mal sucedido realizado por volta de 1907 comprometeu sua plena visibilidade, o que foi atenuado por uma restauração recente, levada a cabo entre 1992 e 1995, e realizada pelo J. Paul Getty Museum de Los Angeles.
Fortuna crítica
editarDesde muito cedo, o Retrato do Cardeal Cristoforo Madruzzo esteve considerado entre as obras-primas de Tiziano e da retratística da escola veneziana, sendo bastante freqüentes as análises superlativas da pintura ao longo da história. A primeira referência ao retrato partiu de Giorgio Vasari, que o comenta em sua célebre Le Vite, de 1568, obra que inaugurou o gênero da historiografia da arte, elencando biografias e comentários críticos sobre os principais artistas e trabalhos do renascimento.[3]
No século XIX, Giovanni Battista Cavalcaselle definiria a obra como “um dos importantes retratos da escola vêneta”[4] e, na segunda metade do século XX, Rodolfo Pallucchini observa que o retrato possui “uma pasta cromática digna de Renoir.”[5] Para Pallucchini:
“ | Jamais como nesta imagem Tiziano soube imprimir o senso de uma vida fluida e corrente, colhida em uma atitude, em um movimento, e um olhar; a personagem em uma inteireza física e espiritual. Neste retrato de figura inteira, Tiziano mostra saber ambientar o modelo em uma nova dimensão temporal, captada mediante a perfeita aisance do seu meio pictórico, fluido e atmosférico a um só tempo. | ” |
Ver também
editarReferências
- ↑ Parreira, Eneida C. «A restauração do retrato de Cristoforo Madruzzo». MASP. Consultado em 16 de setembro de 2008. Arquivado do original em 23 de junho de 2007
- ↑ Wethey, 1971, pp. 116-117.
- ↑ Vasari, 1945 (1ª ed. 1568), pp. 379.
- ↑ Cavalcaselle & Crowe, 1878, pp. 114-142.
- ↑ a b Pallucchini, 1969, pp. 297.
Bibliografia
editar- Cavalcaselle, Giovanni Battista & Crowe, Joseph Archer (1878). Tiziano, La sua vita e i suoi tempi. II. Florença: G.C. Sansoni. pp. 114–142 * Marques, Luiz (1998). Catálogo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. Arte italiana. São Paulo: Prêmio. pp. 81–85
- Pallucchini, Rodolfo (1969). Tiziano. Florença: G.C. Sansoni. 297 páginas * Vasari, Giorgio. Le vite de' più eccellenti pittori, scultori ed architetti da Cimabue fino ai nostri giorni. 1945 (1ª ed. 1568). Florença: Ragghianti. 379 páginas
- Wethey, Harold (1971). The Paintings of Titian. II. Londres: London Phaidon. pp. 116–117