Revolução Iemenita
A Revolução Iemenita, também referida como Revolta no Iêmen em 2011-2012 (português brasileiro) ou Revolta no Iémen em 2011-2012 (português europeu)[5][6] teve início com uma série de protestos e manifestações populares e evoluiu para uma revolta armada no país.[7]
Revolta no Iêmen em 2011 | |||||||||||||
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Parte de Primavera Árabe e Crise Iemenita | |||||||||||||
Manifestações populares em Sanaa, em fevereiro de 2011. | |||||||||||||
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Os protestos no Iêmen começaram em fevereiro de 2011, poucos meses depois do início da revolta tunisina de 2010-2011 e dos protestos egípcios de 2011, inserindo-se na chamada Primavera Árabe. A princípio, a população protestava contra o desemprego, a situação econômica, a corrupção política e as propostas de mudança da Constituição do país apresentadas pelo governo. Gradativamente, porém, o movimento escalou até o ponto em que os manifestantes passaram a exigir a renúncia do presidente Ali Abdullah Saleh, titular do cargo desde 1990.
Antecedentes
editarO Iêmen possui a quarta mais baixa classificação no Índice de Desenvolvimento Humano no mundo árabe depois do Sudão, Djibuti e Mauritânia.[8]
O país também enfrenta um conflito com a Al-Qaeda, bem como uma revolta contra os separatistas no sul do Iêmen,[9] que desejam ver o antigo Iêmen do Sul reconstituído. Além disso, há também uma rebelião xiita dos Houthis no norte do país que pretende a secessão. Saleh foi presidente do Iêmen por mais de 30 anos,[10] e muitos acreditam que seu filho Ahmed Saleh estaria sendo preparado para, eventualmente, substituí-lo.[11] Saleh, ainda, criou um regime de clientelismo, em que o presidente baseava seu governo recorrendo a tribos e ulemás, e um sistema de nepotismo bruto com a concentração de poder político, econômico e militar nas mãos de seus parentes.[12][13]
Quase metade da população do Iêmen vive com 2 dólares ou menos por dia, e um terço sofre de fome crônica.[14] O Iêmen ocupa a posição 146 no Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional em 2010,[15] e 13ª no Índice de Estados Falhados de 2011[16] (subiu até duas posições de 2010).[17]
Um projeto de alteração da Constituição do Iêmen estava em discussão no parlamento, apesar dos protestos da oposição. A alteração visava permitir que Saleh permanecesse no cargo de presidente por toda a vida. Ele exortou a oposição a tomar parte em uma eleição em 27 de abril para evitar o "suicídio político".
Protestos
editarEm janeiro de 2011, logo após a expulsão popular do governo da Tunísia, os principais protestos nas ruas se materializaram em Sanaa, capital iemenita, para exigir mudanças governamentais.[18] Em seu primeiro dia uniram mais de 16 000 pessoas no centro de Sanaa. Inicialmente, os manifestantes protestaram contra um plano para alterar a Constituição e devido a economia lenta do país e altas taxas de desemprego;[19] e exigiram que Ali Abdullah Saleh, presidente do país desde 1990, não apresentasse à reeleição[20] Também houve protestos violentos no sul do país.[18] No entanto, os protestos cresceram mais pelo final de janeiro e assumiu um tom cada vez mais apontando críticas para o presidente Ali Abdullah Saleh, com muitos manifestantes pedindo abertamente por uma nova liderança no Iêmen.[21] Os manifestantes compararam seu presidente ao presidente tunisino deposto Zine El Abidine Ben Ali, pela corrupção do seu governo e a economia pobre do Iêmen.[22][23] Cerca de 16 mil manifestantes tomaram as ruas em Sana em 27 de janeiro, incluindo cerca de 10 mil estudantes da Universidade de Sanaa.[21] O Iêmen é o país mais pobre do mundo árabe e tornou-se um refúgio para militantes islâmicos da Al Qaeda.[24] Os manifestantes rejeitaram as propostas para reforma política anunciada pelo governo por não serem suficientemente extensas para garantir que Saleh e seu filho não mantenham o poder por tempo indeterminado.[25]
Em 2 de fevereiro, o presidente Saleh, anunciou que não concorreria à reeleição em 2013 e que não passaria o poder para seu filho. Tawakel Karman, em seguida, também clamou por um "Dia de Fúria" em 3 de fevereiro, nos moldes das manifestações de massas em todo o país que ajudaram a derrubar o governo da Tunísia e colocar pressão sobre o governo do presidente Hosni Mubarak no Egito.[26] O protesto reuniu mais de 20 mil participantes, bem como uma demonstração de força dos partidários Saleh.[27][28] As forças de segurança responderam aos protestos em Aden com munição real e bombas de gás lacrimogêneo.[29] Depois de Mubarak deixar o poder no Egito, os manifestantes que comemoram a revolução e exigiram uma revolta semelhante no Iêmen foram atacados pela polícia e tribos pró-Saleh.[30] Até o final de fevereiro, várias tribos importantes no Iêmen tinham aderido aos protestos anti-governamentais e os protestos cresceram em tamanho para bem mais de 100 mil em vários dias.[31] Saleh pediu um governo de unidade nacional, mas os líderes da oposição rejeitaram a proposta e pediram que Saleh renunciasse imediatamente.[32]
No dia 1 de março de 2011, o presidente do Iêmen demitiu governadores das cinco províncias em que ocorrem protestos contra o seu governo: Aden, Lahij, Abyan, Hadramaute, e Hudaydah.O presidente acusou os EUA e Israel de orquestrar revoltas pelos países árabes.[33]
“ | Os acontecimentos que agitam o mundo árabe, da Tunísia ao sultanato de Omã, são uma tempestade orquestrada a partir de Tel Aviv, sob a supervisão de Washington | ” |
Em março, os grupos de oposição apresentaram uma proposta que faria Saleh deixar o poder pacificamente,[34][35] mas Saleh se recusou a aceitá-la.[36] Um número de importantes autoridades do governo do Iêmen pediu demissão por causa da violência usada para dispersar protestos.[37] Em 18 de março, 45 manifestantes foram mortos a tiros em Sanaa,[38][39][40][41][42] um incidente que levou à declaração de estado de emergência[41] e condenação internacional.[43][44] Alguns dias depois, Saleh disse estaria disposto a deixar o poder até o final do ano ou mesmo mais cedo,[45][46] porém mais tarde afirmou que não deixaria o cargo.[47][48][49] Até o final de março, seis das 18 províncias do Iêmen estavam fora do controle do governo, segundo as autoridades.[50]
Tentativa de mediação
editarEm abril de 2011, o Conselho de Cooperação do Golfo tentou mediar um fim à crise, com a elaboração de várias propostas para uma transição de poder. No final do mês, Saleh sinalizou que aceitaria um plano que o veria deixar o poder um mês após a assinatura e previa um governo de unidade nacional no período que antecede às eleições.[51] Até o final do mês, no entanto, Saleh mudou de ideia e o governo anunciou que não iria assiná-lo, colocando a iniciativa do CCG em espera.[52][53]
No início de maio, os oficiais novamente indicaram que Saleh assinaria o acordo do CCG, e a oposição concordou em assinar também se Saleh assinasse pessoalmente na sua qualidade de presidente.[54] No entanto, Saleh novamente recuou, dizendo que o acordo não exigia sua assinatura, e a oposição fez o mesmo, acusando Saleh de negociar de má-fé.[55] Os protestos e a violência em todo o país intensificaram-se no sequência desta segunda reversão por Saleh.[56][57]
No final de maio, líderes da oposição receberam garantias de que Saleh finalmente assinaria o plano do CCG; e eles assinaram o acordo na véspera do dia agendado para o presidente assinar também.[58] Saleh no entanto, mais uma vez decidiu não assinar, e um impasse breve, mas tenso, ocorreu em 22 de maio, quando partidários Saleh cercaram o edifício da embaixada dos Emirados Árabes Unidos em Sanaa, prendendo diplomatas internacionais (incluindo o secretário-geral do CCG) até que o governo enviou um helicóptero para levá-los para o palácio presidencial.[59]
Revolta
editarEm 23 de maio, um dia após Saleh se recusar a assinar o acordo de transição, o Xeique Sadiq al-Ahmar, o chefe da federação tribal Hashid, uma das tribos mais poderosas do país, declarou apoio à oposição e seus apoiantes armados entrando em conflito com as forças de segurança leais ao governo na capital Sanaa após Saleh ordenar a prisão de al-Ahmar. Um pesado combate de rua se seguiu, que incluiu bombardeios de artilharia e morteiros. Os milicianos haviam cercado e bloqueado vários edifícios governamentais na capital[60] e o povo na região relatava que parecia que a situação estava se deteriorando em uma guerra civil.[61]
Enquanto a situação em Sana estava se desenvolvendo, cerca de 300 militantes islâmicos atacaram e capturaram a cidade costeira de Zinjibar (com população de 20 mil). Durante a tomada da cidade, os militantes mataram cinco policiais, incluindo um oficial de alta patente, e um civil. Dois outros soldados foram mortos em confrontos com militantes em Loder.[62][63]
No terceiro dia de combates, as unidades militares que desertaram para a oposição foram atingidas pela primeira vez por fogo de morteiro matando três soldados e ferindo 10.[64] À noite, foi relatado que membros da tribo tomaram o controle do edifício do Ministério do Interior, da agência estatal de notícias SABA, e o edifício da companhia aérea nacional.[65]
Um cessar-fogo foi anunciado na noite de 27 de maio, por al-Ahmar,[66] e no dia seguinte, uma trégua foi estabelecida.[67]
Os manifestantes da oposição haviam ocupado a praça principal de Ta'izz desde o início da insurreição contra o governo do presidente Saleh. Os protestos foram em grande parte pacíficos. No entanto, isso mudou em 29 de maio, quando os militares começaram uma operação para esmagar os protestos e eliminar os acampamento dos manifestantes na praça. Tropas teriam disparado balas reais e canhões de água contra os manifestantes, queimado as suas tendas e tratores foram dirigidos sobre alguns deles. A oposição descreveu o evento como um massacre.[68]
No entanto, até 31 de maio, o cessar-fogo tinha avariado e os combates de rua continuavam em Sanaa.[69] Os membros das tribos haviam tomado o controle tanto da sede do Congresso Popular Geral, como dos dirigentes dos principais escritórios da companhia de água.[70]
Atentado ao Palácio Presidencial
editarA situação agravou-se em 3 de junho, depois que um comando rebelde realizou um ataque ao palácio presidencial que deixaram Saleh e outros sete oficiais com altas patentes feridos. Saleh, o primeiro-ministro, o vice-primeiro-ministro, o chefe do parlamento, o governador de Sana e um assessor presidencial ficaram feridos, enquanto estavam orando em uma mesquita dentro do complexo do palácio. Saleh inicialmente afirmou ter se ferido no pescoço e tratado no local; porém, relatórios posteriores indicaram que seus ferimentos eram muito mais graves - incluindo um colapso pulmonar e queimaduras em mais de 40% de seu corpo.[71] Quatro guardas presidenciais[72] e o Xeique Ali Mohsen al-Matari, imame da mesquita, foram mortos. O governo colocou a culpa pelos ataque em integrantes da tribo Hashid, rival de Saleh.[73]
No dia seguinte, Saleh deixou o Iêmen para tratar-se dos ferimentos na Arábia Saudita, onde passou por cirurgias no peito e no pescoço, e sua saída do país foi comemorada nas ruas pela população. Mesmo assim, enfrentamentos entre manifestantes e as forças de segurança continuaram no sul do país, deixando cerca de cinco mortos e dezenas de feridos em Ta'izz.[74] Um cessar-fogo foi mediado pelo rei Abdullah da Arábia Saudita.[75] O vice-presidente Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi assumiu como presidente interino e comandante supremo do forças armadas.[76] Apesar do cessar-fogo, a violência esporádica continuou na capital.[77] Os poderosos filhos de Saleh também se mantiveram no Iêmen em vez de viajar para a Arábia Saudita com o seu pai.[78]
No início de julho o governo rejeitou as exigências da oposição, incluindo a formação de um conselho de transição com o objetivo de formalizar a transferência de poder da administração atual para um governo interino destinado a supervisionar as primeiras eleições democráticas do Iêmen.
Em 6 de agosto, Saleh deixou o hospital na Arábia Saudita, mas ele não retornou ao Iêmen.[79]
Em 18 de setembro, tropas leais ao presidente Saleh abriram fogo contra manifestantes em Sanaa, matando pelo menos 26 pessoas e ferindo centenas. Testemunhas disseram que as forças de segurança e civis armados abriram fogo contra manifestantes que saíram na Praça da Mudança, onde estavam acampados desde fevereiro exigindo mudança de regime, e marcharam em direção ao centro da cidade. No início daquele dia, as tropas do governo dispararam morteiros no distrito de Al-Hasaba em Sanaa, a casa do chefe tribal da oposição Xeique Sadeq al-Ahmar, que afirmou que os seus combatentes não responderiam ao fogo depois de terem sido bombardeado pela Guarda Republicana.[80]
Em 23 de setembro, a televisão estatal iemenita anunciou que Saleh havia retornado ao país após três meses em meio de turbulência crescente que em uma semana viu aumento de tiroteios nas ruas de Sanaa e mais de 100 mortes.[81]
Acordo de transferência de poder
editarEm 23 de novembro de 2011, Saleh viajou para Riad, na Arábia Saudita, para assinar o plano do Conselho de Cooperação do Golfo para a transição política, que havia anteriormente rejeitado. Ao assinar o documento, ele concordou em transferir legalmente os poderes da presidência para seu vice-presidente Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi no prazo de 30 dias e renunciar formalmente pelas eleições presidenciais de 21 de fevereiro de 2012, em troca de imunidade para ele e sua família.[82]
Em 21 de janeiro de 2012, a Assembleia de Representantes do Iêmen aprovou a lei de imunidade. Também nomeou o vice-presidente Hadi como candidato para a eleição presidencial.[83] Saleh deixou o Iêmen, no dia seguinte para buscar tratamento médico nos Estados Unidos,[84] e está buscando exílio em Omã.[85]
A eleição presidencial foi realizada no Iêmen em 21 de fevereiro de 2012. Com um relatório sustentando que possuiu 65 por cento de participação, Hadi obteve 99,8% dos votos. Abd Rabbuh Mansur al-Hadi tomou o juramento de posse no Parlamento do Iêmen em 25 de fevereiro de 2012. Saleh retornou para casa no mesmo dia para assistir a posse de Hadi a presidência. Depois de meses de protestos, Saleh havia renunciado à presidência e transferido formalmente o poder para seu sucessor, marcando o fim do seu reinado de 33 anos.[86][87] Como parte do acordo, al-Hadi irá supervisionar a elaboração de uma nova Constituição e governar apenas dois anos, até que novas eleições parlamentares e presidenciais serão realizadas em 2014.[88]
Ver também
editarReferências
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