Tomu Uchida
Tomu Uchida (内田吐夢 Uchida Tomu?, 26 de abril de 1898 – 7 de agosto de 1970), nascido Tsunejirō Uchida, foi um diretor de cinema e roteirista japonês.[1][2][3] Uchida escolheu o nome artístico Tomu, uma transliteração do inglês Tom, porque, quando escrito em caracteres kanji, significa “cuspir sonhos”.[4]
Tomu Uchida 内田吐夢 | |
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Uchida em 1929
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Nascimento | Tsunejirō Uchida 26 de abril de 1898 Okayama, Okayama, Império do Japão |
Morte | 7 de julho de 1970 (72 anos) Tóquio, Japão |
Nacionalidade | japonês |
Ocupação | |
Período de atividade | 1920–1970 |
Biografia
editarInício de carreira
editarDepois de deixar o ensino médio em Okayama prematuramente, Uchida começou a atuar em filmes do estúdio de curta duração Taishō Katsuei em 1920, mudando-se mais tarde para a Nikkatsu em 1926.[2][3][4] Em 1927, ele estreou como diretor com o filme Kyōsō mikkakan (競走三日間? lit. "três dias de competição").[2][3][4] Nos anos seguintes, Uchida trabalhou em diversos gêneros, incluindo o filme de tendência Ikeru ningyo (生ける人形? lit. "bonecos vivos"), que é considerado um dos pioneiros nesse estilo,[3][4] a comédia satírica e histórica Adauchi senshu (仇討選手? lit. "jogador vingativo")[3][4] e o filme de gangster Keisatsukan,[4] o único filme mudo completo sobrevivente de Uchida,[5] que os historiadores do cinema descreveram como "um pastiche perfeito, bem à frente de seu tempo" (Noël Burch) e "incrivelmente estiloso" (Alexander Jacoby).[4] Sua postura política foi descrita pelos críticos como oscilando entre a esquerda e a direita: enquanto Ikeru ningyo e Adauchi senshu eram considerados "progressistas", seu filme de propaganda de 1933 sobre a Manchúria, Sakebu Ajia (叫ぶ亜細亜? lit. "Ásia clama"), foi apoiado pelos militares japoneses, e Keisatsukan descreveu os membros do Partido Comunista Japonês como gangsters.[6]
Os filmes de Uchida foram cada vez mais aclamados pela crítica, onde Kagirinaki Zenshin (1937), baseado numa ideia proposta por Yasujirō Ozu, e Tsuchi (1939) foram eleitos pela revista Kinema Junpo como os melhores filmes do seus respectivos anos de lançamento.[7] Tsuchi foi elogiado pela representação realista da vida dos arrendatários pobres do período Meiji.[2][7] Ao mesmo tempo, o longa serviu como propaganda oficial da política do governo em focar na agricultura doméstica após o início da Segunda Guerra Sino-Japonesa.[6] Considerado o filme pré-guerra mais famoso de Uchida,[4] só existe cópias incompletas do filme.[8][9]
Em 1941, Uchida saiu do estúdio Nikkatsu e viajou para a China por 80 dias, afirmando que “queria ir e simplesmente foi para lá”.[6] Mais tarde, ele se juntou à Manchukuo Film Association de Masahiko Amakasu e visitou a Manchúria em 1943, planejando um filme de propaganda para glorificar a invasão da Manchúria pela Divisão de Tanques Kantōgun, mas que nunca foi realizado.[6][7] Uchida viajou para a Manchúria novamente em maio de 1945, com o motivo de pedir desculpas a Amakasu pelo fato de o filme planejado não ter sido produzido.[6][7] O Japão rendeu-se em Agosto de 1945, e Uchida, após um internamento temporário,[6] tornou-se ativo em dar palestras a jovens cineastas chineses, por vezes prejudicados por lutas entre forças nacionalistas e comunistas, mas também forçados ao trabalho físico e à doutrinação maoísta.[7] Em 1953, ele voltou ao Japão já com 55 anos de idade.[7][10]
Carreira do pós-guerra
editarApós seu retorno, Uchida trabalhou, principalmente, com o estúdio Toei.[11] Sua reputação no pós-guerra era muito dependente de seus filmes jidaigeki, começando com Chiyari Fuji (1955), uma "mistura bem avaliada de comédia e violência e [...] crítica aos valores feudais" (Jacoby),[11] "[ambos] progressistas e nostálgicos, humanistas e nacionalistas, pacíficos e violentos" (Craig Watts).[7]
Ele seguiu com dois filmes de drama contemporâneo, filmados para a Shintoho e Nikkatsu, respectivamente.[1] Tasogare Sakaba (1955), onde seu cenário é restrito a uma taverna a noite, apresentou um microcosmo da sociedade japonesa do pós-guerra e como alguns de seus membros lidaram com a guerra já acabada,[11] quando lançou no mesmo ano o filme Jibun no ana no nakade, sua história em relação a uma família em desintegração foi misturada com críticas a um Japão que, como afirma uma personagem do longa, tornou-se uma colônia não oficial dos EUA.[4][11] Entre os filmes de época Dai-bosatsu tōge (1957) e Naniwa no koi no monogatari (1959), Uchida fez mais um drama contemporâneo, Mori to mizuumi no matsuri, sobre a minoria indígena Ainu na ilha de Hokkaido. Sake To Onna To Yari, Yoto Monogatari: Hana No Yoshiwara Hyakunin Giri (ambos de 1960), e Koiya koi nasuna koi (1962) novamente foram dramas de época, onde este último distinguiu-se pelos seus conjuntos e cores expressionistas.[4]
Kiga kaikyō (1965) foi repetidamente citado como a obra-prima de Uchida.[2][3][12] Um "thriller policial monumental" (Jasper Sharp)[12] ambientado no Japão do pós-guerra entre os anos 1947 a 1957, ele segue a história de um homem que cresceu na pobreza e quer começar uma nova vida com o dinheiro obtido de um assassinato. O filme, rodado em 16 mm e ampliado para 35 mm no intuito de de obter um efeito granulado,[13][14] recebeu vários prêmios nacionais de cinema[13] e foi incluído na lista dos "200 melhores da crítica" composto pela Kinema Junpo.[15][16] Uchida deixou a Toei protestando contra a distribuição de uma versão abreviada do filme sem sua aprovação,[13] mas depois retornou à empresa para dirigir Jinsei gekijō: Hishakaku to Kiratsune (1968).[17]
Uchida viria a falecer em 1970, aos 72 anos, de câncer.[4]
Legado
editarUma retrospectiva do trabalho de Uchida foi apresentada numa exposição do Tokyo FILMeX no ano de 2004.[18]
Retrospectivas sobre Uchida nos EUA foram realizadas no Berkeley Art Museum e no Pacific Film Archive em 2007[19] e no Museu de Arte Moderna de Nova York em 2016.[20]
Filmografia selecionada
editar- Ikeru ningyo (1929, filme perdido)
- Adauchi senshu (1931, filme perdido)
- Keisatsukan (1933)
- Jinsei gekijō (1936, parcialmente encontrado)
- Kagirinaki Zenshin (1937)
- Hadaka no machi (1937, filme perdido)
- Tsuchi (1939, parcialmente encontrado)
- Chiyari Fuji (1955)
- Jibun no ana no nakade (1955)
- Tasogare sakaba (1955)
- Kuroda sodō (1956)
- Abarenbo Kaido (1957)
- Dai-bosatsu tōge (1957)
- Mori to mizuumi no matsuri (1958)
- Naniwa no koi no monogatari (1959)
- Yoto Monogatari: Hana No Yoshiwara Hyakunin Giri (1960)
- Sake to onna to yari (1960)
- Miyamoto Musashi (1961–1965, série de 5 filmes)
- Koiya koi nasuna koi (1962)
- Kiga kaikyō (1965)
Referências
- ↑ a b «内田吐夢». Japanese Movie Database (em japonês). Consultado em 13 de julho de 2023. Cópia arquivada em 30 de abril de 2023
- ↑ a b c d e «内田吐夢». Kinenote (em japonês). Consultado em 13 de julho de 2023. Cópia arquivada em 31 de maio de 2023
- ↑ a b c d e f «内田吐夢». Kotobank (em japonês). Consultado em 13 de julho de 2023. Cópia arquivada em 13 de julho de 2023
- ↑ a b c d e f g h i j k Jacoby, Alexander. «Tomu Uchida». Senses of Cinema (36). Consultado em 25 de janeiro de 2012. Cópia arquivada em 12 de julho de 2023
- ↑ «Policeman». BAMPFA. Consultado em 14 de julho de 2023. Cópia arquivada em 14 de julho de 2023
- ↑ a b c d e f Miyao, Daisuke (2022). «The Adventures of Uchida Tomu». In: Desser, David. A Companion to Japanese Cinema. [S.l.]: Wiley Blackwell. pp. 90–104. ISBN 9781118955321
- ↑ a b c d e f g Watts, Craig. «Blood Spear, Mt. Fuji: Uchida Tomu's Conflicted Comeback from Manchuria». Bright Lights Film Journal. Consultado em 25 de janeiro de 2012. Arquivado do original em 14 de julho de 2009
- ↑ Sallitt, Dan (3 de julho de 2010). «Escaped from the Archives: Tomu Uchida's "Earth" (1939) on Notebook». MUBI. Consultado em 29 de novembro de 2018. Cópia arquivada em 14 de julho de 2023
- ↑ «Tsuchi (Earth). 1939. Directed by Tomu Uchida». Museum of Modern Art. Consultado em 12 de julho de 2023. Cópia arquivada em 12 de julho de 2023
- ↑ Sharp, Jasper. «The Outsiders». Midnight Eye. Consultado em 25 de janeiro de 2012. Cópia arquivada em 12 de julho de 2023
- ↑ a b c d Jacoby, Alexander (2008). Critical Handbook of Japanese Film Directors: From the Silent Era to the Present Day. Berkeley: Stone Bridge Press. ISBN 978-1-933330-53-2
- ↑ a b «The best Japanese film of every year – from 1925 to now». The British Film Institute. Consultado em 4 de janeiro de 2021. Cópia arquivada em 2 de junho de 2023
- ↑ a b c «飢餓海峡» (em japonês). Kotobank. Consultado em 27 de dezembro de 2020. Cópia arquivada em 14 de julho de 2023
- ↑ «Kiga kaikyo (Straits of Hunger aka A Fugitive from the Past). 1964. Directed by Tomu Uchida». Museum of Modern Art. Consultado em 12 de julho de 2023. Cópia arquivada em 12 de julho de 2023
- ↑ «Kinema Junpo critics top 200». MUBI. Consultado em 12 de julho de 2023. Cópia arquivada em 2 de setembro de 2023
- ↑ «Top 200 - Kinema Junpō (2009)». Sens critique (em francês). Consultado em 12 de julho de 2023. Cópia arquivada em 12 de julho de 2023
- ↑ «人生劇場 飛車角と吉良常» (em japonês). Kinema Junpo. Consultado em 12 de julho de 2023. Cópia arquivada em 4 de dezembro de 2023
- ↑ «Tomu Uchida at Tokyo FILMeX 2004». Midnight Eye. 28 de fevereiro de 2005. Consultado em 15 de julho de 2023. Cópia arquivada em 15 de outubro de 2023
- ↑ «Tomu Uchida: Japanese Genre Master». BAMPFA. Consultado em 13 de julho de 2023. Cópia arquivada em 13 de julho de 2023
- ↑ «Tomu Uchida: A Retrospective». Museum of Modern Art. Consultado em 13 de julho de 2023. Cópia arquivada em 13 de julho de 2023
Ligações externas
editar- Sharp, Jasper; Jason Gray; Tom Mes. «Tomu Uchida at Tokyo FILMeX 2004». Midnight Eye. Consultado em 26 de janeiro de 2012
- Tomu Uchida. no IMDb.