Velocidade da luz variável
A teoria da velocidade da luz variável (VSL do inglês variable speed of light) afirma que, por alguma razão, a velocidade da luz no vácuo, representada por c, pode não ser constante. Na maior parte das situações da física da matéria condensada quando a luz atravessa um meio, tem realmente velocidade inferior. Alguns cálculos na teoria quântica de campos afirmam que fotões virtuais também podem viajar a diferentes velocidades numa pequena distância; no entanto, nada disto implica que alguma coisa possa viajar mais rápido que a luz. É normal pensar que nenhum significado pode ser retirado a partir de uma quantidade dimensional, como a velocidade da luz a variar no tempo (em oposição a uma grandeza adimensional como a constante de estrutura fina), no entanto, em algumas teorias especulativas e controversas da cosmologia, a velocidade da luz também varia mudando os postulados da relatividade restrita.
História
editarEm 1937, Paul Dirac e outros começaram a investigar as consequências de constantes naturais variarem com o tempo. Por exemplo, Dirac propôs uma mudança de apenas 5 partes em 1011 por ano da constante gravitacional universal de Newton, G para explicar a relativa fraqueza da força da gravidade quando comparada com outras forças fundamentais. No entanto, Richard Feynman mostrou nos seus famosos livros Lectures on Physics[1] que a constante gravitacional provavelmente não podia ter mudado tanto nos últimos 4 mil milhões de anos, baseado em observações geológicas e do sistema solar (contudo é necessário assumir que a constante não mudaria outras constantes).
Não é claro o que realmente significa uma mudança de uma grandeza dimensional, devido ao facto de qualquer quantidade deste tipo poder mudar com a escolha das unidades. John Barrow escreveu:
- Uma importante lição que aprendemos com a forma como os números puros como α constante de estrutura fina definem o mundo é o que realmente significa para os mundos serem diferentes. O número puro a que chamamos constante de estrutura fina representada por α é uma combinação da carga do electrão, e, da velocidade da luz, c, e da constante de Planck, h. A princípio podemos ser levados a pensar que um mundo onde a velocidade da luz fosse mais lenta seria um mundo diferente. Isto seria um erro. Se c, h, e e mudassem de modo que os valores que teriam em unidades métricas (ou quaisquer outras) fossem diferentes quando os procurássemos nas nossas tabelas de constantes físicas, mas o valor de α permanecesse o mesmo, este novo mundo seria indistinguível do nosso observacionalmente. A única coisa que conta na definição dos mundos são os valores de constantes adimensionais da natureza. Se todas as massas passassem ao dobro (incluindo a massa de Planck mP) ninguém se daria conta porque todos os números puros definidos por razões de dois quaisquer pares de massa manteriam-se inalterados.[2]
Qualquer equação de uma lei da física pode ser expressa de maneira a que todas as quantidades dimensionais sejam normalizadas resultando que apenas permaneçam quantidades adimensionais. De facto, os físicos muitas vezes "escolhem" as unidades de modo a que as constantes físicas c. G, h/(2π) e 4πε0 tomem o valor um, resultando que toda a quantidade física é normalizada contra a sua correspondente unidade de Planck. Assim, muitos físicos pensam que especificar a evolução de uma quantidade dimensional na melhor das hipóteses não tem sentido e que na pior das hipóteses é inconsistente.[3] Quando as unidades de Planck são usadas e as equações das leis da física são expressas de forma adimensional, nenhuma das constantes dimensionais como c, G ou h se mantém, apenas quantidades adimensionais. Limpas da sua dependência de unidades antropométricas, simplesmente a velocidade da luz, a constante de gravitação ou a constante de Planck desaparecem das expressões matemáticas da realidade física e assim não podem ser alvo de variações hipotéticas. Por exemplo, no caso da constante de gravitação, G, as constantes adimensionais relevantes que se assumiu que variavam tornaram-se no final em razões entre a massa de Planck e as massas de partículas elementares. Algumas quantidades adimensionais chave (que se pensava serem constantes) dependem da velocidade da luz, notavelmente a constante de estrutura fina teria uma variação significativa e a sua possível variação continua a ser estudada[4].
Falando especificamente da VSL, se a definição de metro do sistema SI fosse revertida à sua definição pré-1960 como o comprimento de uma barra protótipo (tornando possível que a medição de c variasse), então uma mudança concebível de c (o recíproco do tempo que a luz levaria a percorrer este comprimento protótipo) podia ser interpretado a nível mais fundamental como uma mudança na razão adimensional entre o protótipo de metro e o comprimento de Planck ou na razão entre o segundo SI e o tempo de Planck ou uma mudança em ambos. Se o número de átomos que constituem o protótipo do metro permanecer inalterado (como devia num protótipo estável), então a mudança perceptível no valor de c podia ser a consequência de uma mudança mais fundamental na razão adimensional do comprimento de Planck com o tamanho dos átomos ou com o raio de Bohr, ou, em alternativa, uma mudança na razão do tempo de Planck com o período de uma radiação particular de um núcleo de césio-133 ou ambas.
Um grupo, que estudava quasares distantes, diz ter detectado uma variação na constante de estrutura fina[5] ao nível de uma parte em 105. Outros autores contestam estes resultados. Outros grupos que estudam quasares alegam que nenhuma variação é detectável com sensibilidades muito mais elevadas.[6][7][8] Mais análises, com restrições ainda maiores, baseadas no estudo de certas quantidades isótopicas no reactor de fissão nuclear natural de Oklo parecem indicar que não existe uma variação.[9][10]
Paul Davies e os seus colaboradores sugeriram que é em princípio impossível discernir qual das constantes dimensionais (carga elementar, constante de Planck e velocidade da luz) que compõem a constante de estrutura fina é responsável pela sua variação.[11] Isto foi, no entanto, disputado por outros e não é geralmente aceite. [12][13]
Física da matéria condensada
editarOs fotões movem-se a velocidades inferiores a c, a não ser que estejam a viajar no vácuo. Esta propriedade conduz-nos a vários efeitos importantes, como a dispersão (ver também índice de refracção). A diminuição da velocidade na matéria condensada, como os gases, os líquidos e os sólidos, pode ser considerável. A velocidade de grupo da luz pode ser reduzida a velocidades arbitrárias, mas apenas para um sinal (banda curta) arbitrariamente lento (ver "luz lenta").
Em certas circunstâncias altamente improváveis, também é possível preparar experiências nas quais a velocidade de fase ou de grupo da luz seja maior que c. Como estas velocidades são construções matemáticas, estas observações de velocidades da luz maiores que c não indicam nenhuma contradição com a causalidade ou com a relatividade restrita, uma vez que nenhuma informação ou energia viaja mais rápido que c.
Física clássica
editarAcredita-se que o fotão, a partícula da luz que medeia força electromagnética, não possui massa. A chamada acção de Proca descreve a teoria de um fotão massivo.[14] Classicamente, é possível ter um fotão que tenha uma massa extremamente pequena, como o neutrino. Estes fotões iriam propagar-se a uma velocidade inferior à da luz definida pela relatividade restrita e teriam três direcções de polarização. No entanto, na teoria quântica do campo, a massa do fotão não é consistente com a teoria de gauge ou com a renormalização e portanto é normalmente ignorada. Apesar disso, a teoria quântica do fotão massivo pode ser considerada na abordagem Wilsoniana da teoria campo efectivo à teoria quântica do campo, onde, dependendo se a massa do fotão é gerada por um mecanismo de Higgs ou é inserida numa maneira ad hoc nos Lagrangeanos de Proca, os limites implícitos em várias observações/experiências pode ser diferente.[15]
Teoria quântica
editarNa teoria quântica do campo o princípio da incerteza de Heisenberg indicam que os fotões podem viajar a qualquer velocidade por pequenos períodos de tempo. Estes fotões podem ter qualquer velocidade incluindo velocidades muito superiores à da luz. Citando Richard Feynman "... também existe uma amplitude para a luz ser mais rápida (ou lenta) que a velocidade da luz convencional. Descobriu na última palestra que a luz não viaja apenas em linhas rectas; agora, descobre que não viaja apenas à velocidade da luz! Pode surpreende-lo que exista uma amplitude para o fotão viajar a velocidades superiores ou inferiores à velocidade da luz convencional, c."[16] Apesar disso, estes fotões virtuais não violam a causalidade ou a relatividade restrita uma vez que estes não são directamente observáveis e informação não pode ser transmitida na teoria. Os diagramas de Feynman e os fotões virtuais são interpretados não como uma imagem física do que está realmente a acontecer, mas apenas como uma ferramente de cálculo (o qual, em alguns casos, envolve vectores de velocidade mais rápida que a luz).
Cosmologia
editarUma cosmologia da velocidade da luz variável foi proposta independentemente por John Moffat e a equipa Andreas Albrecht e João Magueijo para explicar o problema do horizonte da cosmologia.[17][18][19] [20] [21] [22] [23] A ideia é que a luz se propagava pelo menos sessenta vezes mais rápido num passado distante, e assim regiões distantes do universo em expansão teriam tido tempo de interagir desdo o início do universo. Assim, foi proposta com uma alternativa para a inflação cósmica, apesar de ser menos claro como reproduz os outros sucessos da cosmologia inflacionária como os problemas dos monopolos e do universo plano e como reproduz a homogeneidade e isotropia observadas no universo, e a invariância de escala do espectro de petrubações iniciais..
Não existe uma maneira conhecida de resolver o problema do horizonte com a variação da constante de estrutura fina, porque a sua variação não muda a estructura causal do espaço-tempo. Para fazer isto é necessário modificar a gravidade variando a constante de Newton ou redefinindo a relatividade restrita. Cosmologias VSL propõem contornar isto variando a quantidade dimensional c desfazendo a invariância de Lorentz das teorias da relatividade restrita e geral de Einstein de uma forma específica.[24] No entanto, foi realçado por George Ellis e Uzan[25] que a cosmologia VSL é uma modificação ad hoc de várias equações da física sem um princípio subjacente consistente, como uma formação lagrangiana de onde as equações do movimento possam ser derivadas. Foi sugerido[26] que uma modificação na acção de Maxwell-Einstein pode levar a luz a propagar-se a velocidades superiores à velocidade da luz definida pela métrica, mas isto causa necessariamente problemas com a causalidade e com a mecânica quântica.[27]
Referências
- ↑ R. P. Feynman (1970). «7». Lectures on Physics. 1. [S.l.]: Addison Wesley Longman
- ↑ John D. Barrow, The Constants of Nature; From Alpha to Omega – The Numbers that Encode the Deepest Secrets of the Universe, Pantheon Books, New York, 2002, ISBN 0-375-42221-8.
- ↑ J. P. Uzan, "The fundamental constants and their variation: Observational status and theoretical motivations," Rev. Mod. Phys. 75, 403 (2003). Arxiv
- ↑ ibid
- ↑ J.K. Webb, M.T. Murphy, V.V. Flambaum, V.A. Dzuba, J.D. Barrow, C.W. Churchill, J.X. Prochaska and A.M. Wolfe (2001). «Further Evidence for Cosmological Evolution of the Fine Structure Constant». Phys.Rev.Lett. 87. 091301 páginas Arxiv
- ↑ H. Chand, R. Srianand, P. Petitjean and B. Aracil (2004). «Probing the cosmological variation of the fine-structure constant: results based on VLT-UVES sample». Astron. Astrophys. 417: 853 Arxiv
- ↑ R. Srianand, H. Chand, P. Petitjean and B. Aracil (2004). «Limits on the time variation of the electromagnetic ne-structure constant in the low energy limit from absorption lines in the spectra of distant quasars». Phys. Rev. Lett. 92: 121302 Arxiv
- ↑ S. A. Levshakov, M. Centurion, P. Molaro and S. D’Odorico. «VLT/UVES constraints on the cosmological variability of the fine-structure constant». Astron. Astrophys. Arxiv
- ↑ A. I. Shlyakhter (1976). «Direct test of the constancy of fundamental nuclear constants». Nature. 264: 340
- ↑ T. Damour and F. Dyson (1996). «The Oklo bound on the time variation of the fine-structure constant revisited». Nucl. Phys. B480: 37 Arxiv
- ↑ P.C.W. Davies, Tamara M. Davis, Charles H. Lineweaver (2002). «Cosmology: Black holes constrain varying constants». Nature. 418: 602–603
- ↑ M. J. Duff, "Comment on time-variation of fundamental constants", Arxiv.
- ↑ S. Carlip and S. Vaidya (2003). «Black holes may not constrain varying constants». Nature. 421: 498 Arxiv
- ↑ J. D. Jackson (1998). Classical Electrodynamics 3 ed. [S.l.]: Wiley
- ↑ E. Adelberger, G. Dvali and A. Gruzinov, Photon Mass Bound Destroyed by Vortices preprint.
- ↑ R. Feynman (1988). QED: the strange theory of light and matter. [S.l.]: Princeton University Press. p. 89
- ↑ Moffat, John; "Superluminary Universe: A Possible Solution to the Initial Value Problem in Cosmology" Arxiv
- ↑ João Magueijo, Mais Rápido Que a Luz Gradiva , Lisboa , 2003, ISBN 972-662-905-5.
- ↑ Andreas Albrecht and João Magueijo (1999). «A time varying speed of light as a solution to cosmological puzzles». Phys. Rev. D59: 043516 Arxiv
- ↑ J. D. Barrow. «Cosmologies with varying light-speed» Arxiv
- ↑ J. Magueijo (2000). «Covariant and locally Lorentz-invariant varying speed of light theories». Phys. Rev. D62: 103521 Arxiv
- ↑ J. Magueijo (2001). «Stars and black holes in varying speed of light theories». Phys. Rev. D63: 043502 Arxiv
- ↑ J. Magueijo (2003). «New varying speed of light theories». Rept. Prog. Phys. 66: 2025 Arxiv
- ↑ Bruce A. Bassett, Stefano Liberati, Carmen Molina-Paris and Matt Visser (2000). «Geometrodynamics of variable-speed-of-light cosmologies». Phys. Rev. D62: 103518 Arxiv
- ↑ George F. R. Ellis and J.-P. Uzan (2005). «'c' is the speed of light, isn't it?». Am. J. Phys. 73: 240–7
- ↑ P. Teyssandier, "Variation of the speed of light due to non-minimal coupling between electromagnetism and gravity", Ann. de la Fondation Louis de Broglie, 29 173–186, 2004 [1] Arquivado em 30 de novembro de 2006, no Wayback Machine..
- ↑ A. Adams, N. Arkani-Hamed, S. Dubovsky, A. Nicolis and Riccardo Rattazzi, "Causality, Analyticity and an IR Obstruction to UV Completion", Arxiv
Ligações externas
editar- «"Faster Than the Speed of Light?"» (em inglês). The Daily Galaxy (Fevereiro de 2017)