Absolutismo na Espanha
Consolidado no contexto da Guerra de Sucessão (1702 – 1714), o absolutismo espanhol é o fenômeno histórico de construção do estado da Espanha. Segundo esse fenômeno, o rei era o representante de Deus na Terra: aquele que defendia, por em cima das particularidades, a Igreja, a Nação, a Arte, a Lei e o Estado.
Contudo, e devido às amplas diferenças existentes (desde Galiza, Catalunha, País Valenciano até as Ilhas Baleares e ultramar), esse processo de centralização do poder, nas mãos dos reis de Castela, não só não unificou os múltiplos e diferentes territórios hispânicos como, principalmente, trouxe consequências cruciais para a história dos mesmos.[1]
Antecedentes
editarO pensamento absolutista espanhol fundamenta-se na época das migrações bárbaras, quando surge a ideia de construir uma monarquia peninsular hereditária. Assim, em 560, Leovigildo criava a primeira entidade política independente da Península Ibérica, o Reino Visigótico, que seria interrompido devido à chegada da contribuição islâmica.[2]
Os reis de Castela
editarDurante o reinado de Afonso III de Astúria-Leão (866 – 910), a ideia de construção da monarquia peninsular hereditária, com capital em Toledo, era reabilitada. No entanto, o passo decisivo foi realizado no reinado de Afonso VII de Leão-Castela (1126 – 1157), quando se exigiu a vassalagem cristã dos reinos de Portugal, Navarra e Aragão e muçulmana das taifas de Saragoça, Valência, Dênia e Múrcia, através da proclamação do rex et imperator totius Hispaniae.[3] Segundo Afonso X de Castela, era sua mãe que dava para o afonso a uniformidade de religião e educação, nos moldes propostos por Isidoro de Sevilha. Ainda, os Trastâmaras investiram nas alianças matrimoniais com os reinos de Portugal, Leão, Navarra, Aragão, Granada e com os condados catalães e asiáticos.
Recursos facilitadores
editarFinalmente, chegaram os Habsburgo, e o absolutismo castelhano conheceu o seu auge através:
- dos pactos de política matrimonial dinástica e de influência; especialmente com o reino de Aragão,
- do volume de territórios integrados na Península Ibérica, especialmente o Principado da Catalunha – que que tinha saída para o mar Mediterrâneo, os reinos de Granada, Navarra, Nápoles, o ducado de Milão, o condado da Borgonha e os Países Baixos – que eram dinâmicos; assim como o volume de territórios colonizados no Novo Mundo,
- da superabundância do tesouro conseguida através da força política e militar da aristocracia fundiária, dos metais preciosos do Novo Mundo e da economia da lã,
- da mudança da capital para Madrid e
- das ordens de Calatrava, Alcântara e Santiago.
Contudo, o reino Castela ainda era instável: as Cortes reuniam-se em assembleia esporadicamente e não possuíam jurisdição; assim como a nobreza e o clero gozavam de imunidade fiscal.[4]
Dificuldades encontradas
editarAragão
editarA aristocracia fundiária de Aragão encontrava-se sobre campos de cultivo estéreis onde os servos e os campesinos moriscos escravizados mal sobreviviam.[5]
Catalunha
editarA tradição mercantil da Catalunha no mar Mediterrâneo, havia sido substituída pela debilidade econômica devido à longa depressão dos campos de cultivo, às epidemias, às pestes, às bancarrotas comerciais, à concorrência com os genoveses, às revoltas dos pequenos comerciantes, das corporações de oficio e dos campesinos, e uma guerra civil (1462-1472), entre outros.[5]
Valência
editarA aristocracia fundiária de Valência explorava o campesinato morisco e expandia a atividade mercantil. Valência possuía uma estrutura política complexa: cada província contava com as suas próprias Cortes, assim como as suas próprias instituições, jurisdições e clero.[5]
Medidas adotadas
editarComo o complexo sistema de liberdades não-castelhanas dificultava a construção de um Estado, foi necessária a implantação de um programa de reorganização:
- decapitação dos membros das ordens militares e anexação de suas propriedades,
- demolição de castelos, exílio de aristocratas fundiários e proibição de guerras particulares,
- supressão das autonomias municipais, implantação de corregedores oficiais e expansão da justiça real,
- conquista dos benefícios eclesiásticos,
- omissão da nobreza, do clero e consequente dominação das Cortes,
- aumento das arrecadações fiscais,
- exclusão das influências e consequente reforma do Conselho Real,
- nacionalização e modernização da máquina do Estado,
- reserva das altas posições militares e diplomáticas aos novos magnatas, ou antigos cavaleiros,[6] e transformação da pequena nobreza em corregedores e
- imobilização da propriedade rural, privilégio da atividade pastoril, desestimulação do cultivo de cereais e estimulação da indústria.[5]
Resultado das medidas
editarComo não se conseguiu nem um Estado unificado, nem uma moeda única, nem um único sistema fiscal, nem um único sistema legislativo: a Inquisição servia como o aparelho ideológico que compensava a divisão e dispersão dos territórios.[5]
Os Bourbon
editarCom a Guerra de Sucessão (1702 – 1714), consolidam-se tanto o pensamento visigodo, de uma monarquia peninsular hereditária, como o pensamento castelhano, de uma propriedade histórica e intelectual da Península Ibérica. Através da vitória de Castela e a consequente assinatura do Tratado de Utrecht, Castela passa a denominar-se Espanha.[7] Uma vez efetivamente perdidas as liberdades, o reinado de Felipe de Espanha (1713 – 1724 e 1724 – 1746) abolia todo e qualquer outro direito público e instituição que não fosse espanhola através do Decreto de Nova Planta (ex. as Cortes Catalãs, o primeiro parlamento co-legislador da Europa, fundado em 1283).
Cronologia da denominação Espanha
editar- Na época das influências gregas arcaicas, o vocábulo Ibéria denominava exclusivamente a localização geográfica da Península Ibérica.
- Na época do mundo romano, o vocábulo Hispânia (em latim: Hispania), além de denominar exclusivamente a localização geográfica da Península Ibérica, denominava, também, unidades administrativas (ex. Hispânia Citerior, Hispânia Ulterior e, posteriormente, Diocese das Hispânias).
- Na época das migrações bárbaras, Leovigildo iniciava a primeira entidade política independente da Hispânia, o Reino Visigótico: pensamento que seria sucessivamente reabilitado.
- Na época da contribuição islâmica, o vocábulo Hispânia denominava tanto a localização geográfica da Península Ibérica como o território controlado pelos muçulmanos.
- Na época das migrações cristãs, o vocábulo Hispânia ou a expressão Marca Hispânica denominava uma fronteira do império Carolíngio, sem constituir nenhuma unidade administrativa.
- Na época da Restauração da Independência de Portugal (1668), os reis de Castela continuavam a utilizar insistentemente a denominação Hispânia, de forma que Portugal manifestou-se contrário.
- A partir do contexto da Guerra de Sucessão (1702 – 1714), e como Portugal já não se considera uma das Hispânias, Castela autodenomina-se Espanha.
Ver também
editarReferências
- ↑ OCAÑA, J. C. Las cortes de Cádiz y la Constituición de 1812. Acesso 07 Ago. 2010
- ↑ EYZAGUIRRE, J. Historia del Derecho. Santiago: Universitaria, 2006.
- ↑ REILLY, B. F. The Chancery of Alfonso VII of León-Castilla. Speculum, Vol. 51, No. 2., 1976. pp 243-261.
- ↑ (Junta de Castilla y León). Contexto: cortes y ciudades. Arquivado em 30 de abril de 2009, no Wayback Machine. Acesso 07 Ago. 2010
- ↑ a b c d e ANDERSON, P. Linhagens do Estado absolutista. São Paulo: Brasiliense, 2004.
- ↑ ROSELLO, M. A. Leitura e debate em História Moderna II. São Paulo: CEUCLAR, 2008.
- ↑ TRAPERO, M. Castilla: una metáfora de España. Las Palmas de Gran Canaria: Provincia[ligação inativa], No. 11 Abril, 2002.