Assistolia fetal
Assistolia fetal é um método abortivo recomendado para a interrupção da gravidez acima de 20 semanas.
Método
editarO método consiste na injeção de componentes farmacológicos para que os batimentos cardíacos do feto sejam interrompidos. Por fim, ele é retirado da barriga da mãe.[1] Ele também é utilizado para a redução fetal.[2] As drogas usadas na técnica são o cloreto de potássio (4 a 6 mEq), digoxina (1 a 2 mg) ou lidocaína ( 200 a 240 mg). A digoxina é o método mais fácil de ser aplicado, porém é o menos efetivo. A morte do feto normalmente é observada no instante da injeção com o uso de cloreto de potássio e após cinco minutos com lidocaína, porém a digoxina leva tempo para sua absorção, e normalmente é injetada um dia antes do aborto.[3] A injeção é feita no cordão umbilical ou de forma intracardíaca.[4] O método foi apontado pelos jornais brasileiros como indolor para o feto e é utilizado pois o risco de morte da mãe e a sobrevivência fetal transitória aumenta com o aborto feito com maior idade gestacional.[4][5] O procedimento também evita o desgaste físico tanto da mãe quanto do médico.[6]
Ele é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para interrupção da gravidez acima de 20 semanas.[4] O protocolo para o procedimento foi publicado em junho de 2023 após revisão da literatura médica sobre o assunto.[6][7]
No Brasil
editarO serviço de assistolia fetal é buscado principalmente pela falta de hospitais que realizem o aborto legal durante o começo da gestação ou pela demora para a busca do serviço. Muitos dos casos de estupro no país são causados em menores de idade por familiares, há casos de mulheres mantidas em cativeiro, falta de conhecimento de parte da população ou até dificuldade de identificar os sintomas da gravidez.[1][6] De acordo com especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo, 80% dos casos de aborto por assistolia fetal no país são realizados por menores de idade.[8]
Em 3 de abril de 2024, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou resolução que proibia a utilização da assistolia fetal em casos acima de 22 semanas,[9][10] decisão que inviabilizou casos de aborto legal. A justificativa é de que o feto estaria apto a vida extrauterina.[11] Entre os órgãos que criticaram a resolução, estão a Rede Médica pelo Direito de Decidir, o Conselho Nacional de Saúde[4] e a Advocacia-Geral da União.[12][13] O Ministério Público Federal cobrou explicações do CFM.[14] O PSOL acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) declarando que a resolução era inconstitucional.[15] A Justiça Federal em Porto Alegre chegou a suspender a resolução no dia 13 de maio,[16] mas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região suspendeu a liminar pelo procedimento já estar tramitando no STF.[17] O Ministro Alexandre de Moraes a suspendeu a resolução no dia 17 enquanto o caso era julgado.[18] Um mês após a resolução, no dia 18 de junho, Moraes deu 48 horas para que os hospitais municipais Vila Nova Cachoeirinha, Dr. Cármino Caricchio, Dr. Fernando Mauro Pires da Rocha, Tide Setúbal e Professor Mário Degni provassem que estavam realizando a assistolia fetal após o surgimento de casos de negação do serviço, incluindo para uma garota menor de idade.[19] Até o dia 23, nenhum hospital respondeu Moraes.[20]
Após suspenção da resolução do CFM, houve uma onda de desinformação nas redes sociais, como o Facebook e o Instagram.[4] No mesmo dia da decisão de Moraes, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) propôs o PL 1904/2024,[21][22] que equipara o aborto após 22 semanas ao homicídio simples.[23] O PL foi aceito em regime de urgência pelo presidente da Cârama dos Deputados Arthur Lira (PP-AL) em 12 de junho.[24] Em protesto, o deputado Dr. Zacharias Calil (União-GO) encenou o procedimento da assistolia no plenário da Câmara.[25] Em 17 de junho, por proposta do senador Eduardo Girão (Novo-CE), conhecido por ter tentado entregar uma réplica de um feto para o Ministro dos Direitos Humanos Sílvio Almeida em abril de 2023, o Senado Federal agendou a discussão sobre o tema, onde dos 17 convidados, 15 eram contrários ao aborto.[26][27][28] Durante a discussão, a contadora de histórias Nyedja Gennari interpretou o feto chorando após sofrer o procedimento.[29]
Em 3 de junho, o Ministro Kassio Nunes Marques pediu destaque para o julgamento, que obrigou que este fosse feito de maneira presencial e anulou os votos de Moraes e André Mendonça e atrasou o procedimento.[30][31] No dia 19, Moraes reuniu-se com a diretoria do CFM para discutir o tema.[32]
Referências
editar- ↑ a b «Aborto legal: o que é a assistolia fetal e por que os médicos a consideram importante?». O Globo. 14 de junho de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Beriwal, Sridevi; Impey, Lawrence; Ioannou, Christos (outubro de 2020). «Multifetal pregnancy reduction and selective termination». Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. The Obstetrician & Gynaecologist (em inglês) (4): 284–292. ISSN 1467-2561. doi:10.1111/tog.12690. Consultado em 23 de junho de 2024
- ↑ «Clinical practice handbook for quality abortion care» (PDF). Organização Mundial da Saúde (em inglês). 15 de junho de 2023. ISBN 978 92 4 007520 7. Consultado em 23 de junho de 2024
- ↑ a b c d e Ítalo Rômany (29 de maio de 2024). «Assistolia fetal: procedimento em pauta no STF gera onda de desinformação nas redes». Agência Lupa. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Lara Castelo (17 de junho de 2024). «Assistolia fetal: o que é o procedimento no centro do debate sobre aborto». Viva Bem. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ a b c Júlia Motta (21 de junho de 2024). «Assistolia fetal: entenda o procedimento usado para aborto após 22 semanas». Revista Fórum. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Érica Montenegro (17 de junho de 2024). «Assistolia fetal: como é o método para interromper gravidez avançada». Metrópoles. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ «Assistolia fetal: o que é o procedimento recomendado pela OMS?». Folha de S.Paulo. 16 de junho de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ «Resolução CFM nº 2.378». Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior. 3 de abril de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Mayara Souto (4 de abril de 2024). «CFM proíbe procedimento de aborto legal e MPF cobra explicação». Correio Braziliense. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
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- ↑ Fernanda Vivas (19 de junho de 2024). «Em manifestação ao STF, AGU diz que é inválida resolução do CFM que proíbe assistolia fetal». G1 e TV Globo. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ André Richter (20 de junho de 2024). «AGU: resolução do CFM que proíbe a assistolia é inconstitucional». Agência Brasil. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
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- ↑ «Justiça derruba resolução do CFM que proíbe procedimento pré-aborto». Agência Brasil. 18 de abril de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
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- ↑ Aline Gouveia (20 de junho de 2024). «Hospitais devem provar que realizam assistolia fetal para abortos». Correio Braziliense. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
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- ↑ «Norma que proíbe assistolia fetal será tema de sessão de debate no Plenário». Agência Senado. 5 de junho de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Thaísa Oliveira (17 de junho de 2024). «Senador bolsonarista convoca debate e ignora especialistas contra PL Antiaborto por Estupro». Folha de S.Paulo. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ Vitória Macedo (17 de junho de 2024). «Saiba quem é Nyedja Gennari, mulher que interpretou feto chorando em sessão do Senado». Folha de S.Paulo. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ José Higídio (3 de junho de 2024). «Supremo vai reiniciar análise de norma do CFM que dificulta técnica pré-abortiva». Consultor Jurídico. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024
- ↑ «Kassio leva STF a julgar resolução do CFM sobre aborto legal no plenário físico». UOL. 11 de junho de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024 – via Estadão
- ↑ «Alexandre de Moraes receberá Conselho Federal de Medicina para discutir aborto». Folha de S.Paulo. 18 de junho de 2024. Consultado em 23 de junho de 2024. Cópia arquivada em 23 de junho de 2024