Direitos LGBT na Namíbia
Pessoas LGBT na Namíbia, enfrentam certos desafios sociais e judiciais problemáticos não enfrentados pelo restante da população namibiana. A sodomia é ilegal apenas para homens no país, e pode ser punida com prisão. Declarações de líderes governamentais, como Sam Nujoma, Theopolina Mushelenga e Jerry Ekandjo, sobre homossexuais têm atraído condenações e polêmicas dentro e fora do país. Apesar da falta de direitos legais experimentados pelos cidadãos LGBT da Namíbia, a aceitação e tolerância dessas pessoas é muito maior do que na maioria dos países africanos.[1][2][3][4]
O cenário nacional para as pessoas LGBT na Namíbia melhorou nos últimos anos. O principal grupo de defesa LGBT do país é o OutRight Namibia, formado em março de 2010 e oficialmente registrado em novembro de 2010. O mesmo organizou as primeiras paradas do orgulho LGBT da Namíbia e declara ser "uma voz para mulheres lésbicas, homens gays, bissexuais, pessoas trans e intersexuais na Namíbia". Outros grupos LGBT incluem o MPower Community Trust, que fornece conscientização sobre saúde sexual para homens gays e bissexuais, o Namibian Gays and Lesbian, que fornece aconselhamento para pessoas LGBT e organiza programas educacionais para aumentar a conscientização dos namibianos, Tulinam, um grupo LGBT religioso e o Wings to Transcend Namibia, um grupo de transgêneros.[5][6]
História
editarA homossexualidade e as relações entre pessoas do mesmo sexo foram documentadas em vários grupos namibianos modernos. No século 18, o povo Cóis reconheceu os termos koetsire, que se refere a um homem que é sexualmente receptivo a outro homem, e soregus, que se refere ao tipo de masturbação que instrui desejo a alguém do mesmo sexo.[7]
Na década de 1920, o antropólogo alemão Kurt Falk relatou cerimônias de homossexualidade e casamento gay entre os povos ovambos, namas, hererós e himbas. Entre os hererós, as amizades eróticas (conhecidas como oupanga) entre duas pessoas independentemente do sexo, eram comuns e normalmente incluíam o sexo anal (okutunduka venena). Além disso, nos anos 1970, o etnógrafo português Carlos Estermann observou uma tradição do ovambo em que os homens conhecidos como esenge se vestiam como mulheres, faziam trabalhos femininos e se casavam com outros homens. A sociedade ovambo acreditava que eles estavam possuídos por espíritos femininos.[8][9]
Legalidade da atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo
editarNa Namíbia, não há cláusula de sodomia codificada, mas continua sendo um crime no país de acordo com a lei comum romano-holandesa que está em vigor no local. A sodomia foi definida como "relações sexuais intencionais entre dois homens da espécie humana." Isso, portanto, exclui relações sexuais que aconteção entre casais lésbicos.[10][11]
A seção 299 da Lei de Processo Penal de 2004 faz referência a questões probatórias sobre a acusação de sodomia ou tentativa de sodomia. O Anexo 1 da Lei, agrupa a sodomia juntamente com uma lista de outros crimes como crimes para qual a polícia está autorizada a fazer uma prisão sem mandado ou a usar força letal no decorrer da prisão, entre outros aspectos; seções 38, 42, 44, 63 e 112. Demonstrações públicas de afeto entre dois homens podem ser consideradas comportamento "imoral", que é punível de acordo com a Lei de Combate às Práticas Imorais de 1980.[11][12][13]
Em agosto de 2016, o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas divulgou um relatório em Vinduque, conclamando o governo do país a abolir a proibição de práticas homossexuais e da sondomia. Reagindo ao apelo do comitê, John Walters, o Ombudsman da Namíbia, cujo escritório tem o intuito de promover e proteger os direitos humanos, disse que "as pessoas deveriam ser livres para viver suas vidas como bem entenderem". Walters disse:[14][15][16]
Acho que a velha lei da sodomia serviu ao seu propósito. Quantas acusações ocorreram? Acredito que nenhuma nos últimos 20 anos. Se não processamos as pessoas pelo ato, por que temos o mesmo?
O Governo da Namíbia informou às Nações Unidas que atualmente não tem nenhuma intenção de revogar a lei que diz respeito a sodomia. Vários legisladores expressaram opiniões diferentes, no entanto, a Presidente do Conselho Nacional Margaret Mensah-Williams disse, "independentemente de quão desconfortável seja, é hora de falarmos sobre a comunidade LGBT. Eles fazem parte de nosso país." Yvonne Dausab, presidente da Comissão de Reforma e Desenvolvimento da Lei, disse que a Constituição da Namíbia carece de "linguagem suficiente para descrever e proteger os direitos pertencentes à comunidade LGBT+". Em uma mesa redonda organizada em 2019 pelo Ombudsman para abordar a proteção e os direitos para a comunidade LGBT da Namíbia, vários legisladores pediram que essas questões fossem abordadas com urgência.[17][18]
Em junho de 2019, após a revogação da lei de sodomia na Botswana por seu Tribunal Superior, a primeira-dama Monica Geingos pediu a revogação da lei da Namíbia, dizendo que "os dias da lei de sodomia estão contados" e "Namíbia será a próxima".[19]
Tabela de resumo
editarAtividade sexual do mesmo sexo legal | / Para homens: não aplicada; legalização proposta.
Para mulheres: legal. |
Idade igual para consentimento | / Para homens: não aplicada;
legalização proposta. Para mulheres: legal. |
Leis anti-discriminação apenas no emprego | |
Leis anti-discriminação no fornecimento de bens e serviços | |
Leis antidiscriminação em todas as outras áreas (incluindo discriminação indireta, discurso de ódio) | |
Casamentos do mesmo sexo | Processo judicial pendente. |
Reconhecimento de casais do mesmo sexo | |
Adoção de enteados por casais do mesmo sexo | |
Adoção conjunta por casais do mesmo sexo | |
Pessoas LGBT autorizadas a servir abertamente nas forças armadas | |
Direito de mudar o gênero legal | Cirurgia de redesignação sexual necessária. |
Acesso à FIV para lésbicas | |
Barriga de aluguel comercial para casais gays | |
MSMs autorizados a doar sangue |
2024
editarEm 27 de julho de 2023, o ativista LGBTQ Friedel Dausab entrou com uma ação judicial contra a lei da sodomia no Tribunal Superior da Namíbia. O objetivo era declarar a lei inconstitucional.[20]Após as alegações finais em novembro de 2023, o veredicto foi inicialmente marcado para 17 de maio de 2024, Dia Internacional Contra a Homofobia. Após vários adiamentos[21][22], o veredicto foi finalmente anunciado em 21 de junho de 2024.[23] A lei da sodomia foi declarada inconstitucional e, portanto, ineficaz. Isto significa que as relações sexuais entre homens e outros chamados “crimes sexuais não naturais” não são mais proibidos.[23]
Referências
- ↑ O'Donnell, Belinda (3 de março de 2016). «HERE ARE THE MOST AND LEAST TOLERANT COUNTRIES IN AFRICA». UN Dispatch
- ↑ «Relação homossexual é crime em 70 países, mostra relatório mundial». Folha de S.Paulo. 20 de março de 2019. Consultado em 29 de janeiro de 2021
- ↑ «Namibia | Human Dignity Trust». www.humandignitytrust.org. (em inglês). Consultado em 29 de janeiro de 2021
- ↑ «LGBT Rights in Namibia». Equaldex (em inglês). Consultado em 29 de janeiro de 2021
- ↑ «Namibia's Compliance with the U.N. Convention Against Torture: LGBTI Rights» (PDF). The Advocates for Human Rights. 2016
- ↑ «OutRight Namibia». Consultado em 13 de dezembro de 2018. Cópia arquivada em 3 de setembro de 2017
- ↑ «Boy-Wives and Female Husbands». www.willsworld.org. Consultado em 29 de janeiro de 2021
- ↑ DAS WILHELM, Amara, Tritiya-Prakriti: People of the Third Sex. Xlibris Corporation, 21 May 2004
- ↑ «Boy-Wives and Female Husbands». www.willsworld.org
- ↑ Office of the Ombudsman of Namibia (2013). Baseline Study Report on Human Rights in Namibia (PDF). [S.l.: s.n.] 97 páginas
- ↑ a b Mendos, Lucas Ramón (2019). State-Sponsored Homophobia 2019. Geneva: ILGA. 355 páginas
- ↑ Combating of Immoral Practices Act 21 of 1980 (as amended by Married Persons Equality Act 1 of 1996 (GG 1316) brought into force on 15 July 1996 by GN 154/1996 (GG 1340) Combating of Immoral Practices Amendment Act 7 of 2000 (GG 2325) brought into force on 15 June 2000 by GN 141/2000 (GG 2348)).
- ↑ Criminal Procedure Act 25 of 2004.
- ↑ «Namibia's ombudsman calls for same-sex marriage amidst UN report furore». MambaOnline - Gay South Africa online. 23 de agosto de 2016
- ↑ Let gays be – Walters The Namibian
- ↑ Reporter, New Era; Reporter, New Era (18 de agosto de 2016). «UN wants homosexuality legalised in Namibia». New Era Live
- ↑ «Walters backs LGBT marriage». Namibian Sun. 10 de julho de 2019
- ↑ «Same-sex marriages before full bench». Namibian Sun. 15 de julho de 2019
- ↑ «Sodomy law's days numbered - Geingos». Namibia Sun. 14 de junho de 2019
- ↑ Zeitung, Allgemeine; Kruger, Stefan Noechel,Kristien (7 de julho de 2022). «Sodomie-Gesetz angefochten». Allgemeine Zeitung (em alemão). Consultado em 22 de junho de 2024
- ↑ Menges, Werner (18 de maio de 2024). «Judgement on sodomy law challenge moved to June». The Namibian (em inglês). Consultado em 22 de junho de 2024
- ↑ Damon, Andrea (20 de junho de 2024). «Activists hoping for positive sodomy law judgement». The Namibian (em inglês). Consultado em 22 de junho de 2024
- ↑ a b Menges, Werner (21 de junho de 2024). «Sodomy law declared unconstitutional». The Namibian (em inglês). Consultado em 22 de junho de 2024