Henrique Calapez da Silva Martins

militar português

Henrique Calapez da Silva Martins[nota 1] ComA (6 de março de 19182 de outubro de 2010) foi um militar e político português, membro da Legião Portuguesa e comprometido com o Estado Novo, conhecido por em 1961 ter dominado "sozinho" a Revolta de Beja.

A Revolta de Beja

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 Ver artigo principal: Revolta de Beja

Na noite de passagem de ano de 1961 para 1962, um grupo de militares comandados por João Varela Gomes e acompanhados por dezenas de civis avança para Beja com o objetivo de tomar de assalto o quartel. O assalto que Varela Gomes e Manuel Serra dirigiram tinha na preparação e na retaguarda Humberto Delgado, que tinha entrado em Portugal, clandestinamente.

Por volta das 2h15m da madrugada o grupo comandado por Varela Gomes entrou no Quartel de Beja, contando com a conivência de três oficiais no interior do quartel, que lhes abriu as portas, anulou primeiro os sentinelas e trancou todos os militares nas casernas após o que se dirigiu ao quarto onde se encontrava o Segundo Comandante Henrique Calapez Silva Martins. Assim que Henrique Calapez Martins abriu a porta do quarto foi alvejado no tórax, um disparo acidental, na versão dos revoltosos. Ferido, Henrique Calapez ripostou quase em simultâneo, usando uma pistola m/915 ‘Savage’[1], atingindo Varela Gomes no baço. Segue-se uma troca de tiros entre os revoltosos e o Major Henrique Calapez, conseguiu dominar a revolta e colocar os golpistas em fuga.[2] Neste ataque, é atingido Jaime Filipe da Fonseca, Tenente-Coronel de Cavalaria e Subsecretário de Estado do Exército, que depois sucumbiria aos ferimentos.[nota 2][4][5]

A 19 de setembro de 1973, o então Coronel de Infantaria foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem Militar de Avis, durante o período de Marcelo Caetano.[6][7]

Mais tarde, em 1987, por ocasião da Presidência Aberta ‘Alentejo verde’, Mário Soares, à chegada a Beja, diria: «se não fosse um tal de major Calapez, o 25 de abril teria sido 15 anos antes».[8]

Carreira político-administrativa

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Foi um funcionário comprometido com o Estado Novo com carreira política e administrativa:[9][8]

  • Adjunto da Delegação Provincial do Baixo Alentejo da Legião Portuguesa;
  • Director do Centro de Milícia da Legião Portuguesa de Beja;
  • Comandante Distrital da Legião Portuguesa de Beja;
  • Adjunto da Defesa Civil do Território do Distrito de Beja;
  • Delegado da Comissão de Censura;
  • Comandou o Batalhão de Caçadores 505 em Angola (1963-65);
  • Comandante militar em Cabo Verde (1967-69);
  • Presidente do Supremo Tribunal Militar na Guiné (1969-70);
  • Deputado na Assembleia Nacional em 1973-74[nota 3].


Como deputado, faz o seu primeiro uso da palavra a 29 de janeiro de 1974, como auto-intitulado "homem independente no pensar e agir" (mas possivelmente coordenando discussão com Morais Barbosa. Intervém também Casal-Ribeiro, cumprimentando o seu papel na "jugulação de uma dessas tentativas subversivas e revolucionárias" em Beja, anos antes[nota 4]).

Pronuncia-se Calapez para denunciar o "terrorismo", começando pela África portuguesa, mencionando, entre outros ataques em Moçambique, o "Massacre do Nhacambo", ataque a aldeia no qual a FRELIMO fez 17 mortos e 31 feridos[10][11]; província ultramarina que Calapez declara de outro modo um dos palcos portugueses "de amizade multirracial".

Ademais, intervém contra o "terrorismo" "indiscriminado e selectivo" no "mundo civilizado", denunciando a actividade da Ação Revolucionária Armada, da Liga de Unidade e Ação Revolucionária e das Brigadas Revolucionárias, que declara "feras humanas". Ignorando as limitações impostas pelo próprio Estado Novo à liberdade política, declara que é "lícito lutar por um ideal" "como homens civilizados, usando as armas da razão, pela palavra e respeito das convicções alheias", com "maturidade" "cívica". Face a isto, pede também para se reconsiderar "o pioneiro" passo da abolição da pena de morte, por forma a retirar "as disposições legais que os tratam [aos "terroristas"] como seres humanos".[12][nota 5]

Vida Pessoal

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Um de oito filhos de Aurora Glória da Silva Callapez e Henrique Martins.

O pai foi presidente e vice-presidente da Câmara Municipal de Silves. Membro do Partido Republicano, e "democrata convicto". Funcionário do Registo Civil, Henrique Martins dirigia ainda uma papelaria e uma tipografia «Artística do Algarve».[nota 6] Nesta última, imprimia o jornal Voz do Sul - Semanário Regionalista Republicano. Figura incómoda para o Estado Novo, integrou o Movimento de Unidade Democrática, apoiando as candidaturas dos oposicionistas Norton de Matos, de Arlindo Vicente e de Humberto Delgado. Encarado como um dos principais oposicionistas de Silves foi, com a sua família, alvo de forte vigilância pela polícia política afeta ao Estado Novo.[13]

À morte de seu pai, em 25 de Maio de 1959, Henrique Callapez Martins geriu a "Tipografia Artística do Algarve", que perdeu então o seu carácter ideológico republicano.[14][15]

  1. "Calapez" é também escrito "Callapez".
  2. Uma fonte indica que terá sido o próprio Calapez a atingir o Jaime da Fonseca, estando ambos em defesa do regime, recebendo Jaime da Fonseca condecoração póstuma "pela coragem" "contra os insurrectos". Jaime era antigo membro dos "Viriatos", corpo português em apoio aos fascistas na Guerra Civil de Espanha.[3]
  3. Estando presente na última sessão parlamentar do Estado Novo.
  4. E para denunciar padres "revolucionários", com "o seu ódio ao regime; o seu desrespeito pelas forças armadas e pelas forças da ordem", como os que haviam participado na Vigília da Capela do Rato, mas também no Porto e na "província".
  5. Compara-os aos terroristas do Exército Republicano Irlandês, e da Federação da Juventude Revolucionária da Turquia
  6. Também, presidente da Associação Comercial de Silves, provedor do Hospital da Santa Casa da Misericórdia, presidente Geral da Junta de Província do Algarve e sócio fundador da Empresa Cinematográfica Silvense.

Referências

  1. REGALADO, Jaime Ferreira (2015). Pistola 7,65 mm m/915 SAVAGE. [S.l.]: Fronteira do Caos. ISBN 978-989-8647-46-7. Resumo divulgativo 
  2. Ramires 2010.
  3. «Processo individual do tenente de Cavalaria Jaime Filipe da Fonseca» 
  4. «MEMÓRIA DO INSTITUTO DA DEFESA NACIONAL» (PDF). p. 118 
  5. «Proposta de condecoração a Jaime Filipe da Fonseca (Tenente-Coronel de Cavalaria; Subsecretário de Estado do Exército)». Janeiro de 1962 
  6. «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Henrique Calapez Silva Martins". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 27 de abril de 2020 
  7. «Henrique Calapez Silva Martins (Coronel de Infantaria)» 
  8. a b Ramires, Mário (8 de outubro de 2010). «Major Sem Medo». Jornal SOL. Consultado em 14 de novembro de 2024 
  9. CASTILHO, J. M. Tavares. «Biografia e Carreira Parlamentar - MARTINS, Henrique Calapez da Silva» (PDF). Assembleia da República 
  10. «Portugal atribui massacre à Frelimo». Diário de Notícias. Consultado em 15 de novembro de 2024 
  11. «25 de Abril. 40 anos. Comando-chefe desmente massacre em Moçambique». Jornal i. 23 de março de 2014. Consultado em 15 de novembro de 2024 
  12. «Debates Parlamentares - Diário 019, p. 404-407 (1974-01-29)». debates.parlamento.pt. Consultado em 15 de novembro de 2024 
  13. Cabrita, Aurélio (21 de julho de 2024). «De Henrique Martins a Gabriela Martins - 3 gerações que engrandeceram Silves e o Algarve». Terra Ruiva. Consultado em 14 de novembro de 2024 
  14. Palma, Patrícia de Jesus (2008). «A produção literária impressa no Algarve durante os séculos XIX e XX». Consultado em 14 de novembro de 2024 
  15. Marreiros, Glória Maria (2000). Quem foi quem? 200 algarvios do séc. XX. Col: Extra-colecção 1. ed ed. Lisboa: Ed. Colibri 

Fontes

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