Terra Indígena Kampa
Kampa e Isolados do Rio Envira é uma terra indígena na Amazônia Legal habitada por povos isolados, localizada no estado brasileiro do Acre.[1][2][3][4] A área está homologada no Cartório do Registro de Imóveis (CRI) e na Secretaria de Patrimônio da União (SPU) via decreto de dezembro 1998.[1][2]
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Em 2007, os povos tradicionais, incluindo os indígenas, foram reconhecidas oficialmente pelo governo brasileiro, através da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT),[5][6][7][8][9] por terem o modo de vida ligado ao meio ambiente e o uso comunitário da terra.[5][10] Reafirmando aos indígenas o direito a sua terra tradicional e a proteção governamental.[11] Assim a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) atua nesta área através da Coordenação Regional "Juruá" e da Secretaria Especial de Saúde Indígena "Alto Rio Juruá".[1]
O estado do Acre é marcado por uma grande parte de sua área representada por áreas naturais protegidas como Terras Indígenas (TI) e Unidades de Conservação (UC).[4] São 35 TI reconhecidas pelo governo federal, mas 24 plenamente regularizadas; com demarcações físicas homologadas pelo presidente e cadastradas na Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e nos cartórios das comarcas.[4]
Histórico
editarO contato de indígenas com a sociedade ocidental na América do Sul ocorre nos últimos quatro séculos; primeiramente em terras peruanas com espanhóis e missionários que tentaram dominá-los e depois durante o ciclo da borracha e exploração de caucho no Peru e seringueiras no Brasil.[2] As terras anteriormente ocupadas apenas por indígenas (etnias diversas), receberam muitos seringueiros que causaram problemas nos indígenas: doenças, ambições e, imposição de outra forma de trabalho.[2] Os Kampa subsistiram enquanto outras etnias desapareceram, sendo usados nas “correrias” contra outros indígenas no trabalho de escraviza-los ou exterminá-los para “limpeza” da área.[2]
Os Kampa deslocaram-se constituindo atualmente várias aldeias nas bacias do rio Ucayali, Envira, Amônia e, Breu.[2] Uma hipótese é, que a região do sudoeste amazônico foi ocupada por etnias da família linguística Aruak,[2][4] mas entre os séculos XVI e XVII grupos da família lingüística Pano pressionados pela invasão espanhola no Peru, no sentido oeste-leste travaram lutas pela disputa dos rios Purus e Juruá.[2][4]
Há aproximadamente 60 anos o grupo liderado por Gregório Kampa, saíram do rio Juruá e chegaram ao alto Envira e, posteriormente outros grupos chegaram para ser mão-de-obra na extração madeireira, assim na década de 1970, os Kampa do Envira dividiam-se em três aldeias.[2]
No final da década de 1940, os Kampa trabalharam para o Seringal Cachoeira do Progresso e Seringal Simpatia, situados na margem direita do rio Envira.[2] No período seco, os homens desciam o rio para o trabalho na Fazenda Califórnia.[2] Na década de 1960 à 1980, sofreram ataques de índios arredios, sendo obrigados a mudarem para o igarapé Paranazinho em 1984.[2] Outros ataques ocorreram levando novamente os Kampa a espalharam-se em oito famílias ao longo do rio Envira.[2]
Em 1976, ocorreu o primeiro Grupo de Trabalho para delimitação da área da TI Kampa (Portaria nº 799/P), que identificou uma área de usufruto de quase 53 mil lia, com então população de 64 indivíduos, além da população do igarapé do Breu que transferia-se ao rio Envira.[2] Após mais dois Grupos de Trabalho consecutivos, a área foi definida em 247.200 ha e perímetro de 350 km.[2] Em 1987, esta foi interditada contra acesso não-indígena (Portaria PP/2753, de 31.07.87) conforme as então normas para terras indígenas de fronteira.[2]
Na década de 1990, a fronteira Brasil-Peru (estado brasileiro do Acre com os departamentos peruanos de Ucayali e Madre de Dios) é formada por áreas de proteção que somam 15 milhões de hectares, um refúgio para esses povos indígenas autônomos e isolados, que não conhecem os limites territoriais internacionais.[12] Onde no Acre são quatro TI oficialmente reconhecidas para a proteção indígena: Kampa e Isolados do Rio Envira, Alto Tarauacá, Riozinho do Alto Envira e, Igarapé Taboca Alto Tarauacá, que somam 636 mil hectares.[12] Em Ucayali e Madre de Dios existem quatro áreas que somam 2,3 milhões de hectares: Reservas Territoriais de Madre de Dios, Isconahua, Murunahua e, Mashco Piro.[12]
Distribuição municipal
editarEsta TI está distribuída em dois municípios do estado brasileiro do Acre:[1]
Município | Área municipal (ha) | TI no município (ha) |
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Feijó | 2 797.542 | 234 311 |
Jordão | 535 728 | 87 658 (37,65%) |
Demografia
editarEsta Terra Indígena é habitada pelos seguintes povos isolados: Mashko / Isolados do Rio Envira,[1][4][13] Yura e, Ashaninka,[1][4] com uma população estimada de 283 indivíduos (Iglesias e Aquino 2005),[1] distribuída em uma área de 247 mil hectares no estado brasileiro do Acre.[2][4] Grupos falantes da família linguística pano e aruak.[4]
Associações
editarNesta área atua a associação "Organização dos Povos Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia" (OPIN).[1]
Bioma
editarEsta Terra Indígena está localizada na bacia hidrográfica do rio Juruá e faz parte do bioma Amazônico, com vegetação composta exclusivamente por floresta ombrófila aberta (clima seco por 2-4 meses ao ano).[1]
Ameaças
editarNa região transfronteiriça Brasil-Peru (Acre, Ucayali e, Madre de Dios) existem muitas as ameaças, como as aberturas de estradas/ramais, a exploração madeireira[14] (nas Reservas Territoriais (RT) de Murunahua e Mashco-Piro e no Parque Nacional Alto Purus[15]), a caça/pesca ilegal, o tráfico, a pressão da exploração madeireira legalizada nos “Bosques de Produção Permanente” e, a pressão da exploração de petróleo/gás concedidos pelo governo peruano as empresas.[14] E devido essas pressões, principalmente a partir de 2006, os povos isolados que vivem nesta área transfronteiriça foram forçados a ir para as áreas protegidas no Acre, principalmente próximo ao rio Envira (área das TI Alto Tarauacá, Kampa e Isolados do Envira e, Riozinho do Alto Envira); próximos aos rios Jordão e Humaitá (área das TI Kaxinawá do Rio Jordão e, Kaxinawá do Rio Humaitá), e;[14] na região alto igarapé Xinane.[16]
No início do século XXI, os avistamentos/saques feitos pelos isolados aumentaram nestas TI e nas moradias dos não-indígenas do entorno, além de ocorrer conflitos entre os grupos isolados,[14] nas aldeias Huni Ku da TI Kaxinawá/Humaitá e nas aldeias Ashaninka da TI Kampa/Envira.[15] Causando reordenamentos territoriais e o contato dos povos isolados, registrado em junho de 2014 pela Frente de Proteção Etnoambiental do Envira (FPEE).[14]
Em setembro de 2024, no estado do Acre ocorreram 2 336 focos de queimadas que foram monitorados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que supera em 59% o ano passado, quando foram captados 1 466 focos.[17] Onde o município mais afetado foi Feijó com 630 focos, que equivale a 27% dos focos, seguido por Tarauacá com 17,8% e, Cruzeiro do Sul, com 10%.[17]
A TI é altamente ameaçada por madeireiros,[1] que de acordo com o projeto Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (PRODES) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), esta área sofreu desmatamento de 1 201 ha até o ano 2000.[1]
Ver também
editarReferências
- ↑ a b c d e f g h i j k «Terra Indígena Kampa e Isolados do Rio Envira». Instituto Terras Indígenas do Brasil (em inglês). Consultado em 24 de outubro de 2024
- ↑ a b c d e f g h i j k l m n o p q Processo FUNAI/BSB/2420/8, Área Indígena KAMPA DO RIO ENVIRA (PDF). Col: Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL). [S.l.]: Ministério da Justiça do Brasil e Fundação Nacional dos Povos Indígenas. 22 de setembro de 2005. Resumo divulgativo
- ↑ Costa, Gleice Gomes. «Catálogo de Metadados Geoespaciais CENSIPAM: Carta Imagem da Terra Indígena Kampa Isolados do Rio Envira - ACRE - 2013». Centro Regional de Porto Velho / Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam). Programa de Monitoramento de Áreas Especiais (PROAE) do estado do Acre. Consultado em 11 de dezembro de 2024
- ↑ a b c d e f g h i «Terras Indígenas do Acre» (PDF). Comissão Pró-Indígenas do Acre (CPI-Acre). Consultado em 24 de outubro de 2024. Resumo divulgativo
- ↑ a b «Comunidades dos Povos Tradicionais se manifestam após pedido de ruralistas pela suspensão dos processos de demarcação de territórios tradicionais». Instituto Memorial Chico Mendes. Consultado em 5 de novembro de 2024
- ↑ «DECRETO Nº 6.040: Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.». Câmara dos Deputados do Brasil. Consultado em 5 de novembro de 2024. Resumo divulgativo
- ↑ «Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007». Observatório de Educação. Consultado em 5 de novembro de 2024
- ↑ «Comissão de Agroecologia reafirma direitos dos povos e comunidades tradicionais e defende Decreto 6040». Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO). 24 de agosto de 2018. Consultado em 5 de novembro de 2024
- ↑ «Descubra quais são os 28 povos e comunidades tradicionais do Brasil». Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes). Consultado em 12 de agosto de 2022
- ↑ «Os Faxinalenses são grupos sociais que compõe territórios específicos da região Centro e Centro-Sul do Estado do Paraná». Instituto Arvoredo Brasil. Consultado em 23 de janeiro de 2016. Arquivado do original em 29 de janeiro de 2016
- ↑ «Funai repudia declarações equivocadas e reafirma compromisso com a proteção dos direitos indígenas e a segurança de seus servidores». Ministério dos Povos Indígenas do Brasil. 2 de novembro de 2024. Consultado em 6 de novembro de 2024
- ↑ a b c «Povos indígenas isolados, o último refúgio». CPI ACRE. Consultado em 11 de dezembro de 2024
- ↑ Ricardo, Fany; Fávero Gongora, Majoí, eds. (2019). Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia brasileira 1a edição ed. São Paulo: Instituto Socioambiental. ISBN 9788582260739. OCLC 1124955605. Resumo divulgativo
- ↑ a b c d e Ricardo, Fany; Fávero Gongora, Majoí, eds. (2019). Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia brasileira (PDF). C3L00002 1a edição ed. São Paulo: Instituto Socioambiental. ISBN 978-85-8226-073-9. OCLC 1124955605. Resumo divulgativo
- ↑ a b Di Deus, Eduardo; Brilhante, Silvia; Iglesias, Marcelo Piedrafita (2009). «Dinâmica Transfronteiriças Brasil - Peru – Grupo de Trabalho para a proteção transfronteiriça do Alto Juruá e Serra do Divisor» (PDF). Comissão Pró-Indígenas do Acre. Consultado em 11 de dezembro de 2024. Resumo divulgativo
- ↑ Pontes, Fabio (11 de fevereiro de 2021). «Indígenas isolados que vivem no Peru se refugiam no Brasil». Amazônia Real. Consultado em 11 de dezembro de 2024
- ↑ a b «Primeira quinzena de setembro tem mais de 2 mil focos de queimadas no Acre». G1 Acre. 16 de setembro de 2024. Consultado em 29 de novembro de 2024
Ligações externas
editar- As Terras Indígenas. Funai.
- Página oficial da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
- ONU. Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. 107ª Sessão Plenária, 13 de setembro de 2007.